segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

 

Direito e Raça, sob a perspectiva de Achille Mbembe

O professor Dr. Jonas Rafael dos Santos, por meio do seminário “Lapidando Ideias” do Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Análise de Políticas Públicas, discute e enriquece o debate a respeito das questões que envolvem o racismo na sociedade moderna. A partir disso, o professor ressalta que, apesar do contexto de reconhecimento da sociedade que o racismo é algo que perpassa todas as relações sociais, poucas pessoas são capazes de compreender e identificar as suas dinâmicas. Nessa perspectiva, nas palavras de Milton Santos:

A mobilização da sociedade em relação ao racismo é realizada a partir de uma perspectiva emocional que se torna passageira. [...] é necessário um processo de conscientização da população em relação ao racismo, uma vez que o assunto diz respeito a todos.

Em visto disso, o professor Dr. Jonas Rafael lança mão da análise de Achille Mbembe, que por sua vez se dedicou ao estudo da questão do racismo numa perspectiva global. Desse modo, o autor nos possibilita compreender as questões que envolvem a raça, bem como realizar o seguinte questionamento: para o direito, a questão da raça importa?

Em primeira análise, Achille enfatiza que o racismo corresponde a uma construção histórica com base nas relações de poder, que por sua vez teve como objetivo a subjugação de grupos racializados em vista da necessidade de legitimar a suposta superioridade de alguns em relação a outros. Tal formulação é ancorada pela contribuição de diversos intelectuais e pensadores europeus, africanos e americanos. Nesse sentido, pode-se destacar Michel Foucault, uma vez que Mbembe se apropria dos conceitos de Biopolítica e Biopoder para entender que o racismo corresponde a uma tecnologia de dominação fundamental para organizar a sociedade capitalista.

Em vista disso, na esfera jurídica, pode-se afirmar que o racismo se faz presente, uma vez que, segundo o G1, 83% dos presos injustamente por reconhecimento fotográfico no Brasil são negros. Nesse sentido, depreende-se os negros são a maioria das vítimas desse tipo de erro. Além disso, de acordo com Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2021, os negros correspondem a 66,3% da população carcerária do país. Dessa forma depreende-se que, apesar do art.5° da CF/88 dispor a respeito da igualdade entre os indivíduos independentemente de raça ou cor, no Brasil, não produz efeitos de forma eficiente, assim, contribuindo para a manutenção de um sistema jurídico que favorece a classe dominante em detrimento dos que estão em condição de subjugados.  

Em segunda análise, Mbembe divide o período da modernidade em três momentos: a acumulação primitiva de capital (entre os século XV e XIX) que orquestrou uma rede de tráfico transatlântica responsável pela transformação de homens e mulheres em mercadorias; já o segundo momento (compreendido entre os séculos XIX e XX) configurou um cenário de protagonismo das comunidades subjugadas, nesse sentido destaca-se a Revolução do Haiti, a abolição do tráfico de escravos, bem como a descolonização africana; por último, o início do século XXI com a globalização dos mercados, o desenvolvimento da ideia do dever-negro.

A exemplo disso, pode-se destacar a importância do movimento Vidas Negras Importam, que por sua vez lutam pelo fim da violência praticada contra os negros em escala mundial. Tal movimento ganhou destaque após o assassinato de George Floyd, vítima de racismo policial nos Estados Unidos. Segundo Mbembe, define-se o racista como sendo o indivíduo que se afirma pelo ódio, construindo o outro não como o seu semelhante, mas como um objeto ameaçador do qual seria necessário se proteger ou destruí-lo em virtude de não conseguir dominá-lo inteiramente.

Nessa perspectiva, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a letalidade policial é recorde no país, sendo que 78% dos mortos são negros. Dessa forma, depreende-se que no Brasil, o órgão de segurança pública pode ser compreendido como instrumento que reverbera o racismo.

          Além disso, Mbembe ressalta que a nova era racial (proposta pelo neoliberalismo) não é estritamente biológica, mas multidimensional. Também, a palavra “negro” não se refere mais exclusivamente a pessoas de origem africana, mas a todos que estão numa condição de precarização devido a nova fase do capitalismo. Nessa perspectiva, pode-se tomar como exemplo a marginalização do indivíduo perante a desigualdade social e econômica.

            Em resumo, no Brasil, o processo de urbanização acelerado, a ineficiência de políticas públicas que visassem a igualdade de oportunidades, além do processo de gentrificação associada à especulação imobiliária, contribuíram para a precarização do indivíduo, sobretudo do negro, que por sua vez é vítima constante de agressões policiais, discriminações, bem como dispõe de menos oportunidades de trabalho e educação de nível superior.

Dessa forma, depreende-se que para o direito, a questão da raça importa, uma vez que a justiça é usada como instrumento para subjugar o negro e refletir o racismo, apesar de haver pequenos avanços quanto à conquista de direitos, tais como a decisão do STF de tornar a injúria racial um crime imprescritível, deve-se salientar que muito precisa ser feito, sobretudo referente às questões sociais que envolvem a marginalização do negro.  

(Italo de Abreu Correia – 1°ano – Direito Noturno)

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