segunda-feira, 8 de novembro de 2021

Olhos de Garapon na modernidade.

Na segunda metade do século XX, frente ao desleixo do Estado Neoliberal em relação as reivindicações sociais, o poder judiciário foi o escolhido (não a dedo, não de propósito, mas por mobilização popular que exigia respostas para sua vulnerabilidade) para resolver os problemas causados pela alienação dos poderes executivo e legislativo. É nesse contexto que o jurista francês Antoine Garapon percebe que o papel da justiça, de fato, é salvar os desamparados de um mundo em que eles não tenham voz, enxergar o indivíduo marginalizado e servir de tutor. Se voltarmos a 2013, veremos as ideias de Garapon presentes num caso que aconteceu na comarca de Jales, no qual uma pessoa que dizia ter nascido no corpo errado buscou a justiça para resolver esse problema. Ela recorreu a justiça pelo seu direito de ser amparada pelo Estado, pelo direito de ter sua voz ouvida por aqueles que deviam cuidar dela e, por isso, solicitou que o processo de mudança de sexo fosse feito pelo SUS, gratuitamente devido o alto valor da cirurgia. Nesse momento de desamparo, a justiça aparece como via de mão única em direção a resposta, uma vez que o contexto social cala a voz dessas pessoas. Isso é o que Garapon chama de magistratura do Direito. A negligência do Estado liberal está também no fato de que, para quem o governa, a letra da lei é o suficiente. As pessoas marginalizadas deveriam ter suas vozes ouvidas e, as vezes, nosso código até aborda suas questões, mas a pura codificação não resolve nada. Quando falta eficiência de dois dos três poderes, é meio inevitável que a população busque solução no que ainda está de pé, mesmo que em frangalhos. Dessa forma, podemos ver no caso de 2013 as ideias de Garapon agindo, pois em um momento de desamparo, o poder judiciário foi visto como o salvador, algo que até pode parecer natural, mas, na realidade, não passa de um fruto de um contexto social. O poder judiciário não deveria ser a única forma de conseguir ter seus direitos garantidos. E o legislativo? E o judiciário? É uma situação que não pode ser naturalizada, mas ao mesmo tempo, uma discussão muito distante do ambiente popular do nosso país.

Andrew dos Santos Carneiro - Direito noturno, 1 ano

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