segunda-feira, 8 de novembro de 2021

Análise da ADPF 187 sob a ótica de Antoine Garapon

Antoine Garapon discorre, dentre outras temáticas, sobre um fenômeno em que o sujeito se torna o seu próprio legislador, ou seja, ele exerce sobre si as repressões anteriormente externas. Isso é uma consequência do individualismo liberal, uma vez que o indivíduo, desamparado pelo Estado, busca suprir as próprias demandas de forma autônoma. Nessa perspectiva, o autor reconhece a existência, no passado, de uma clara distinção entre o proibido e o permitido; mas que, hoje, essa distinção é particular a cada um, de modo que o sujeito tem uma margem de ação maior, contanto que ele exerça determinados limites sobre si mesmo.
Nesse mesmo contexto, para ilustrar essa autonomia adquirida pelo contexto histórico e econômico, Garapon destaca um caso específico: a diferença entre uso e abuso de drogas. O Estado, quando protagonista do controle social, buscava erradicar o consumo de drogas, de maneira geral, tendo em vista a necessidade de controlar seu mau uso, que levava a consequências sociais. Com a gradativa diminuição de sua intervenção, tornou-se obrigação do indivíduo estabelecer, para si próprio, a diferença entre o uso e o abuso de substâncias, tendo como referência os seus próprios limites.
Primeiramente, é possível mencionar a ADPF 187, de 2011, referente a manifestações a favor da legalização do uso de drogas (o caso específico trata da Marcha da Maconha). O desfecho da ação se baseou em conceitos de liberdade de expressão para a não-criminalização desse tipo de manifestação. Por um lado, é evidente que os direitos invocados -O DIREITO DE REUNIÃO (LIBERDADE-MEIO) E O DIREITO À LIVRE EXPRESSÃO DO PENSAMENTO (LIBERDADE-FIM)- devem ser preservados. No entanto, a aplicação deles nesse contexto foi rasa, no sentido em que foi estabelecido que manifestações contra a lei vigente são encorajadas, desde que não haja apologia ao desrespeito dela (nesse caso, o consumo de drogas ilícitas).
Essa decisão comprova, de acordo com a análise de Garapon, a ausência do papel estatal, suprido pela autonomia do sujeito. Ao liberalizar a manifestação contra as leis, assume-se que o indivíduo, por si só, ou em grupo, pode manifestar contra qualquer norma existente, mesmo que ela tenha objetivo de proteger um grupo minoritário, por exemplo. De maneira perigosa, essa omissão do Estado quanto à legalidade das manifestações, independente do seu teor e da posição da lei quanto a ela, pode surtir efeitos perigosos na sociedade, uma vez que é impossível assegurar que todos os indivíduos são dotados, dentro de si, do discernimento entre proibido e permitido e uso e abuso -ou, nas palavras de Garapon, da prudência invocada pelo legislador.

APDF 187: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5956195

Ana Clara Alves Gasparotto - Direito Matutino - 2º semestre (Turma XXXVIII)


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