sábado, 16 de outubro de 2021

O habitus jurídico como limitante e égide para o Direito

 No capítulo “A força do direito elementos para uma sociologia do campo jurídico” do livro “Poder Simbólico”, de Pierre Bourdieu, o autor explica as nuances do campo jurídico e de alguma forma os caminhos que levam à consolidação do direito na sociedade. O autor inova, pois traz uma perspectiva que dialoga com a visão normativa e também que acrescenta vocabulário e ideias a visão crítica do Direito. 

Para ele, o Direito e o poder se relacionam pela maneira que os agentes jurídicos e todos aqueles que pretendem exercer alguma atividade dentro do campo jurídico se comportam: com linguagem específica, hierarquização e uma série de outras formalidades. Toda essa homogeneização comportamental cria caráter neutralizador e universalista na forma de agir, a sorte que pretende não pessoalizar e ser geral, o autor cunha o termo “habitus” para expressar esse fenômeno e também se referir a uma série de outros valores que o indivíduo deve incorporar para que consiga articular-se no campo jurídico, porém esses capitais (a linguagem e a formalidade por exemplo) se expressam também em outros campos. 

Portanto, como o agir jurídico é influenciado pelo “capital cultural” e parte da construção e do próprio “habitus jurídico, é perceptível como o poder simbólico construído sobre o campo atuou no caso onde o Ministro Luis Roberto Barroso ao justificar seu voto contra a prisão preventiva, a favor do habeas corpus, à um casal que foi preso em flagrante por crime de aborto. O Ministro se posiciona para além do fato de não existir no caso os requisitos para a prisão cautelar, mas também por razões que se subentende sua visão a respeito da criminalização do aborto ser ineficaz, porém devido o poder do status quo, da necessidade de estar consonante com ele, bem como a necessidade do Ministro em seguir os pressupostos morais compreende-se que a sua posição hierárquica lhe permite tecer críticas à lei, sem que possa ainda assim produzir mudanças mais profundas – essa leitura demostra que o “habitus é um fenômeno que atua em várias direções e depende de uma teia de construções sociais para estruturar o ambiente jurídico como estrutura. 

É evidente portanto, que por meio deste processo que mesmo onde há liberdade, o poder simbólico, ou seja, toda essa gama de ideias e “habitus do qual o “campo jurídico” depende para manter confiabilidade para a sociedade serve de apoio para o Direito, porém também o limita à pressupostos uma vez que não há apenas um caminho que determina o exercício desse poder, mas sim ele é pulverizado e irradia sua influência. 

Pierre Bourdieu apesar de ser tão cirúrgico quanto as questões do Direito, não foi um escritor que se ateve apenas a esse universo, e dentre os seus escritos sobre outras áreas e a forma como ele aborda a questão do poder simbólico traz a luz que nenhum universo é fechado em si, bem como e perceptível no caso do voto do Ministro Barroso, a política exerce também influencia nessa decisão, a cultura exerce seu papel e a aceitação ou não da sociedade sobre as questões também sofrem influência de outros capitais e outros campos, que são efeitos da hierarquização com base na clientela, ou seja no poder econômico que os indivíduos que concordam ou não com determinada estrutura possuem. Porém o Campo Jurídico não é organizado propositalmente dessa maneira, para Bourdieu, ele está sobre estruturas que se perpetuam e geram tendências, ou seja, como no caso do Ministro Barroso, mesmo que sem perceber, a formalidade e a cautela que ele utiliza ainda para que criticar a lei ajuda a perpetuar o habitus sem intenção de fazê-lo; pois a linguagem e a formalidade afastam os mais afetados que seriam influenciados pelas críticas tecidas. 


Stephani Ellen Costa Luz 

Turma XXXVIII

Diurno

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