domingo, 6 de setembro de 2020

Violência e exclusão por meio da perspectiva de Max Weber

          O sociólogo alemão Max Weber trabalha a ideia de “ação social” como método para se estudar a sociedade. Diferentemente do “fato social” de Durkheim, a análise de Weber é mais objetiva, não olhando para o núcleo social como um todo, mas sim às ações individuais que compõe um fenômeno social a fim de identificar seus respectivos sentidos. Assim, compreende-se cada ação voltada para uma outra pessoa como uma mobilização de valores do indivíduo, a qual é dotada de uma intencionalidade, seja ela racional, efetiva ou tradicional. Já na área política, Weber reflete sobre os tipos de dominação encontrados na sociedade, na qual determinados indivíduos se submetem à vontade de outros de acordo com a legitimidade dada pela relação, podendo ela ser de ordem legal, carismática ou tradicional. Logo, a ideologia weberiana pode ser utilizada para entender as divergências entre indivíduos de diferentes culturas e como isso acarreta problemáticas como a violência, e para refletir acerca das explorações cotidianas e formas como se exclui do cidadão humilde o direito de questionar a realidade capitalista, onde o direito é o grande mecanismo de controle social e mantimento da ordem vigente.

            Sabendo que ações são condicionadas pelos valores adquiridos pelo indivíduo ao longo de sua vida, o cenário social brasileiro, repleto de realidades distintas entre os habitantes, se torna local de análise das diferentes ações sociais possíveis. Na música “Fim de semana no parque”, do grupo de rap Racionais Mc`s, é tratada a exclusão do direito ao lazer do povo pobre. Na letra, o eu lírico faz comparações entre as interações entre pessoas de classe mais elevada em um clube esportivo fechado e as relações entre crianças nascidas e criadas na periferia. Enquanto aquelas têm suas ações condicionados por uma criação repleta de oportunidades e privilégios, essas são descritas como frutos da informalidade e da degradação do meio, brincando com os pés descalços em ruas de terra, interagindo por meio de palavrões naturalizados em sua linguagem, e em constante contato com as drogas e a criminalidade. Assim, é possível entender, de forma breve, como que se dá o ciclo da criminalidade em periferias. Da perspectiva de Weber, abandonar a escola e ingressar no crime, para o jovem da realidade humilde periférica, pode ter motivação racional (ganhar dinheiro), emocional (apelo dos vínculos sociais) ou tradicional (falta de representatividade no meio educacional por parte de familiares). Logo, a questão da perpetuação da violência em áreas mais pobres mostra-se como um fator complexo, merecendo uma devida atenção por parte das autoridades, que devem prezar por maiores oportunidades para esses cidadãos, ao invés de tratar apenas como “vagabundagem”, como pensam os representantes do conservadorismo que toma conta do quadro político atual.

            Além da análise individual do indivíduo periférico, é relevante que se reflita sobre a relação da localidade composta por esses cidadãos com o aparelho estatal. Por meio da tipificação ideal das comunidades pobres por parte dos agentes do Estado, tem-se a ideia de que o crime toma conta do lugar e que a problemática deve ser tratada de maneira autoritária. Assim, vê-se que, em periferias, as autoridades agem, majoritariamente, de forma agressiva, vendo o morador pobre como o estereótipo do criminoso, colaborando para que esse preconceito se perpetue na cultura da sociedade capitalista excludente. Tal ideia é vista frequentemente em noticiários, onde são veiculadas notícias sobre ações policiais com fins trágicos. No estudo “Notas sobre a história jurídico-social de Pasárgada”, do sociólogo Boaventura de Sousa Santos, moradores de uma favela carioca relatam a relação da comunidade com os meios policial e jurídico brasileiros. Citam como a polícia exerce sua autoridade sob a comunidade por meio da violência, e como juristas efetuam sua dominação por meio do código de conduta elitizado e burocrático do direito, comprometendo a compreensão do povo humilde de sua situação jurídica. Não obstante, todas as relações entre o povo da favela com demais esferas da sociedade aparentam ser condicionadas pelo status legal da comunidade. Em certo momento do texto, um dos moradores fala sobre patrões que dispensam candidatos a vagas de emprego ao descobrirem que esses vivem na favela. Nesse sentido, o que se entende é que a classe empreendedora brasileira leva consigo um pensamento preconceituoso que desfavorece trabalhadores inocentes. A mesma índole pode ser vista em demais setores da sociedade, gerando cenas como a do entregador de aplicativo que, recentemente, foi humilhado por um morador de um condomínio fechado, que afirmava que o rapaz sentia “inveja” de sua condição social e da cor de sua pele.  Dessa forma, percebe-se que a periferia e seus moradores sofrem com as dominações legal, vista nos abusos dos representantes do Estado; carismática, a partir do surgimento de políticos populistas que se aproveitam das deficiências locais para fazerem falsas promessas e se elegerem; e a tradicional, expressa na cultura preconceituosa popular como um todo.

            Logo, o método de análise de Max Weber permite que se repare como a conduta dos indivíduos é traçada e a relação desta com a realidade na qual está inserida. Não somente, a visão de dominação reafirma que vivemos em uma sociedade que preza por aqueles que seguem as normas de uma classe hegemônica, mostrando que o Estado está a serviço dessa elite e trata de forma desigual os cidadãos. Assim, o que se vê é que a existência da criminalidade no Brasil está diretamente relacionada com sua grande desigualdade social e a consequente falta de oportunidades do povo mais pobre. Enquanto se perpetua o ideal dominante de que criminosos são só, e unicamente, frutos de desvio de moralidade, a problemática não será enfrentada da maneira correta, e a injustiça seguirá tomando conta da realidade nacional.

 

João Victor Rodrigues Ribeiro

1º ano- Direito

Noturno

Referências:

 

https://www.letras.mus.br/racionais-mcs/63447/

SANTOS, Boaventura de Sousa. Notas sobre a história

jurídico-social de Pasárgada.

https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2020/08/07/entregador-registra-boletim-de-ocorrencia-apos-sofrer-ofensas-racistas-em-condominio-de-valinhos-video.ghtml

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