segunda-feira, 31 de agosto de 2020

A Ação: Os princípios axiológicos por trás da conduta

 

Nas últimas semanas o caso da garota de dez anos abusada pelo tio no Espírito Santo agitou as redes sociais e provocaram manifestações em todo país. O motivo das agitações era devido a decisão do Supremo Tribunal Federal de assegurar o direito da garota de realizar o aborto. As lamentáveis cenas, de protesto e tumultos de grupos extremistas em frente ao hospital, em que se realizou a operação, foram noticiadas e repercutidas nos meios de comunicação. Assim, em análise ao triste episódio narrado acima, pode-se perceber condutas nos manifestantes baseadas em valores específicos.

O alemão, Max Weber, pilar da sociologia compreensiva e grande influenciador da teoria do agir, responde as indagações mencionadas anteriormente ao classificar as motivações que geram a ação dos indivíduos. Isto é, Weber compreende que os indivíduos agem de acordo com princípios e convicções próprias de cada um. Assim, alguns seres buscando determinado fim age em prol da realização de tal desejo, ou até mesmo age sobre ideais que compreendem serem corretas. Dessa forma, diversas manifestações, seja ela de um indivíduo ou de um grupo, são possíveis de identificar as motivações qualitativas da ação.

Dessa forma, nota-se na sociedade brasileira diversos movimentos de determinados grupos sociais que agem baseados em princípios axiológicos. Princípios estes, muito influenciados por crenças religiosas ou até mesmo por tradições já estabelecidas socialmente. Logo, o caso da garota de dez anos que teve o direito assegurado pelo STF, incomodou alguns dos setores da sociedade, devidamente por tal direito ir contra o princípio destes. Isto é, aqueles que são contra determinadas ações sentem se incomodados quando alguma ação fere os princípios que os incomodados elegeram como corretos. Assim, a construção histórica das ações sociais de cada indivíduo está diretamente associada a realidade social, pois a maneira como cada um interpreta a sociedade reflete no modo de agir de cada ser.

Portanto, os pensamentos do sociólogo alemão, Max Weber se apresenta muito atual a sociedade contemporânea, pois diante da pluralidade de ações que engendram o funcionamento das relações sociais é possível notar diversos aspectos característicos no modo de conduzir a vida de cada indivíduo. Aspectos estes que estão intimamente relacionadas as classificações adotadas por Weber no final do século XIX. Assim, para que atitudes como as relatadas no início deste breve texto, sejam apagadas da nossa sociedade, são necessários os mesmos questionamentos da doutrina compreensiva, isto é, buscar interpretar todas as motivações da ação de cada indivíduo e incorporar aos nossos valores os princípios que mais correspondem a nossa cosmovisão.

 

 Rafael Bronzatto - 1º Direito Matutino 

domingo, 30 de agosto de 2020

O domínio patriarcal presente no sistema judicial brasileiro

No dia 16 de agosto de 2020, uma menina de 10 anos foi a um hospital em Recife, Pernambuco para realizar um aborto garantido por lei, uma vez que essa criança foi vítima de estupro e não possuía estruturas físicas e psicológicas para prosseguir com a gravidez. Ademais, além de ter enfrentado uma viagem até a casa de saúde, pois os hospitais no Espírito Santo- lugar em que a garota reside- de maneira totalmente inadequada se recusaram a realizar o procedimento. Ainda, teve que se deparar com um protesto em frente ao setor de saúde em que grupos religiosos se reuniram com objetivo de impedir que a interrupção da gravidez fosse realizada, utilizando de agressões verbais contra a criança e repúdio a equipe médica que fez o processo. 

Em primeira análise, o caso abordado e essa reação relatada acima não é uma exceção de situação na sociedade contemporânea, e principalmente da realidade brasileira. Isso por que, o aborto foge do tipo ideal como afirma Max Weber, ou seja, o referencial construído historicamente pela influência da Igreja Católica na construção do funcionamento organizacional da sociedade e a cultura conservadora como ideia de valor no Brasil, vai contra os princípios de liberdade da mulher enquanto indivíduo capaz de tomar decisões sobre seu próprio corpo, ainda que essa pessoa seja uma criança inserida em grave contexto de vulnerabilidade marcado por abuso sexual e psicológico. 

Assim, a condução da vida é moldada por fundamentos com base em instituições materiais como já falado, mas também imateriais, como a moral e os valores da família tradicional brasileira, e isso se comprova na sociedade contemporânea, pelo próprio fato da criminalização do aborto no Brasil, ser somente liberado em casos particulares, mesmo que isso custe à vida e o psicológico de milhares de mulheres, em sua maioria negras e periféricas. Para tanto, é essencial destacar que além desse panorama, apesar de algumas mulheres encaixarem-se na especificidade em que é permitida a interrupção da gravidez, essas não possuem a efetivação prática de seus direitos, como por exemplo, essa negação dos hospitais em realizar aquilo que é garantido na teoria pela lei, limitando o acesso dessas pessoas e os recursos, além de não serem acolhidas pela sociedade. 

A partir de tal ótica, segundo Weber essa condução da vida implica na dominação presente nas relações sociais, não somente nas diferenças de classes, mas em todas as esferas da sociedade. Nesse caso, a legitimidade do próprio governo brasileiro que desde sua eleição reproduz condutas contra a legalização do aborto, e posturas "pró-feto" junto à valorização da família heteronormativa é um exemplo de domínio as minorias sociais. Entretanto, é necessário afirmar que isso afeta em maior parcela mulheres negras e periféricas que estão em inseridas em condições de vulnerabilidade, resultando em uma misoginia ocasionada pela tentativa de aborto em clínicas que não oferecem segurança adequada para realizar o procedimento, enquanto mulheres brancas com poder aquisitivo conseguem ter acesso a remédios abortivos ou cruzam a fronteira no Uruguai, onde é permitido o aborto. 

Ademais, relacionando com os estudos de Max Weber e com a atuação do Direito nesse cenário, é importante salientar acerca da racionalidade formal e material na perspectiva do aborto e como essa questão se desenvolve em âmbito jurídico. Com base nesse paradigma, o sistema judicial brasileiro por ser baseado na racionalidade formal e por ter tido suas normas e Constituição desenvolvido por meio de um direito voltado para o "tipo ideal" não leva em consideração a necessidade de particularidades que atendam as minorias sociais, e, sobretudo não possui uma linguagem que alcance todos os indivíduos, sendo forma de grupos hegemônicos continuarem a dominar outros grupos. Para tanto, o que comprova isso é o fato do sufrágio feminino no Brasil ter sido conquistado somente em 1930, ou seja, essa exclusão de participação na própria politica representa essa dominação, e uma vez que os indivíduos não conseguem ter acesso ao dialeto do sistema jurídico pela linguagem rebuscada, e a própria falta de espaço e representatividade, a comunicação torna-se uma forma de colocar-se acima de outros. 

Portanto, é necessária uma modificação no modo em que é conduzido o sistema judicial para que a própria linguagem jurídica não seja um impasse que contribuía para uma dominação que causa a desigualdade e prega pela meritocracia. Logo, é tão fundamental essa transformação para que casos como esse de uma criança de 10 anos e mulheres não tenham seus corpos controlados por falta de acesso e amparo jurídico, ainda frisando o acontecimento da menina que sofreu repúdio de conservadores, é ainda maior a necessidade de assistência e combate para que a cultura do estupro construída desde os processos de miscigenação no Brasil deixe de se perpetuar na contemporaneidade.

                                 

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

A dominação e seus desdobramentos

           O conceito de dominação é um tanto peculiar, pois quando pensa-se nele, surgem automaticamente exemplos mais marcantes, como um Estado totalitário exercendo seu poder sobre os cidadãos, ou o capitalismo subordinando e hierarquizando as classes sociais. E de fato, esses são cenários em que a dominação está presente. Mas também é tão mais que isso. Segundo Weber, “entende-se por poder a oportunidade existente dentro de uma relação social que permite a alguém impor a sua própria vontade mesmo contra a resistência e independentemente da base na qual essa oportunidade se fundamenta”. 1

Esses aspectos de imposição de poder, força dominante e supremacia exercida estão presentes em tantas situações sociais, e simplesmente passam despercebidos pelos indivíduos. Apenas quando tenta-se analisar a sociedade e seus desdobramentos, refletindo sobre as condições cotidianas, finalmente é possível captar alguns desses casos de dominação. Por exemplo, a desigualdade de gênero é um problema gigantesco e com heranças históricas. Ainda assim, existem certas situações em que as mulheres ficam desconfortáveis, são oprimidas ou se sentem inseguras mas não percebem que está acontecendo um problema de desigualdade de gênero. Achamos que a culpa é nossa ou que o problema está em nós, quando na verdade é toda uma construção de dominância masculina que impõe um silêncio ou um certo comportamento feminino. E isso pode ser claramente enquadrado na visão de Weber de legitimação, que é quando ocorre uma aceitação da dominação como algo válido, como algo normal. Logo, o silenciamento das mulheres ocorre pois há uma dominância e priorização da opinião masculina, enquanto a voz feminina é menosprezada.

Outro aspecto constante de dominação ocorre na educação e na quantidade de conhecimento que os indivíduos detêm. Ao se expressar de forma culta e complicada, os indivíduos estabelecem uma barreira intelectual, onde apenas os mais preparados conseguirão compreender o tema. Isso ocorre claramente no direito, já que a linguagem mais rebuscada traz uma dimensão que só será entendida por certos segmentos da sociedade. Evidentemente, esse problema é contraditório pois se o direito serve para coordenar as relações sociais e ordenar condutas de toda a sociedade, de forma igualitária, por que parte da população é excluída na comunicação das leis? Historicamente, o direito surgiu bem antes da escrita. O que significa que ele era acompanhado, inicialmente, pela oralidade. Na Grécia Antiga, mesmo após o surgimento da escrita, as condutas obrigatórias eram difundidas por meio da declamação de poemas, especialmente porque esses alcançavam toda a sociedade e eram extremamente acessíveis.

Em sua obra “Nos confins do direito”, o autor Norbert Rouland explica que “o direito escrito apresenta o risco de ser apenas o instrumento de uma minoria, próxima do poder, ou que o detém”.2 Ou seja, ocorre uma hierarquização do conhecimento. Percebe-se, logo, que os simples instrumentos da escrita ou da linguagem, quando utilizados pelos detentores de poder, são impulsionadores gigantescos da desigualdade e da dominação.

Outros detentores de poder são os donos dos meios de comunicação, que estabelecem condutas e influenciam toda uma população através das redes sociais, dos mecanismos digitais. Um exemplo claro disso é uma entrevista dada por Steve Jobs, em 2010, em que esse declara que não deixava os filhos usarem o seu recém-lançado iPad.3 Os próprios criadores dessas tecnologias que estão tão presentes no cotidiano da sociedade atual, admitem que suas criações são viciantes e perigosas. O objetivo dos criadores de dispositivos digitais e aplicativos é fazer com que o indivíduo fique o maior tempo possível imerso na tecnologia, enquanto seus dados são captados e propagandas são projetadas para influenciar o mercado consumidor.

Evidencia-se, portanto, que as relações de dominação e poder estão inseridas nas mais diversas situações, conforme Weber explica ao apresentar sua definição de poder. De fato, a dominação está na vida social, sob a manifestação e imposição da vontade. No entanto, ela não existe de forma plena, uma vez que pode vir acompanhada de resistência. Por isso surgem revoluções, reformas, mudanças. São a discordância com o sistema vigente, a resistência contra a desigualdade, a imposição autoritária e o controle dos detentores de poder.

Referências:

1 WEBER, Max. Conceitos básicos de sociologia

2 ROULAND, Norbert. Nos confins do direito.

3 https://brasil.elpais.com/brasil/2019/03/20/actualidad/1553105010_527764.html


Mariana Pereira Siqueira – 1° ano Matutino

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Papel da legislação no capitalismo flexível

O capitalismo flexível é basicamente o sistema capitalista com a inserção do trabalhador na lógica de mercado, com risco, inovação e a necessidade de saber vender o seu trabalho para a sociedade, inserindo assim o chamado marketing pessoal.

Há também, nesse modelo, a criação das escalas globais de produção, onde cada empresa se especializa em uma parte do produto final, mas não tem controle do todo, como por exemplo as fabricas da Mitsubishi, onde uma empresa faz o pneu, outra a porta e assim em diante, ficando, no final, a empresa central responsável por desenvolver o produto e vender o produto já construído com a carga de sua marca. Está também nessa lógica a produção sob demanda.

Outro ponto importante que vem com esse modelo é a flexibilização das legislações trabalhistas dos países e uma amplificação das terceirizações, o que é muito criticado pelos marxistas e trabalhistas, sob o argumento de que os trabalhadores saem prejudicados e perdem garantias.

Sob a lógica marxista esse sistema traz diversos pontos negativos, como por exemplo a exploração dos trabalhadores, levando ao extremo desgaste dos mesmos por conta da demanda por alta produtividade e da competição interna entre os trabalhadores, acabando com a solidariedade.

Outro ponto considerado negativo é a necessidade gerada de o trabalhador assumir riscos que ele, como não empreendedor, não escolheu ter e não necessitaria ter caso essa a lógica de marcado não fosse expandida até cada indivíduo do sistema produtivo.

Sob essa perspectiva fica reservado ao direito o papel de evitar que essa lógica se insira de modo a prejudicar os trabalhadores, com as garantias trabalhistas e a proteção do mercado interno frente ao externo, evitando que países com alta produtividade forcem o governo a prejudicarem os trabalhadores do país para aumentar a produtividade, ao custo da saúde e das garantias básicas das pessoas.

Aluno: Nicolas Gomes Izzo.

Turma: 1° ano de Direito noturno

Os Riscos do Trabalhador Contemporâneo

 

Os pensadores do século XIX, Karl Marx e Friedrich Engels, desenvolveram o método do materialismo histórico dialético, ao analisar a sociedade através da perspectiva das classes sociais e as relações de produção. A partir do método marxista, Richard Sennett analisa as relações de poder na contemporaneidade, dissertando a respeito da condição de flexibilidade característica do sistema capitalista no século XXI.

A crescente competitividade, presente desde meados do século passado, condicionou ao capitalismo os imperativos chamados de acumulação flexível, que consiste na produção de acordo com a demanda. Ademais, com a intensificação da globalização, as empresas tornam-se flexíveis à medida que ocorre a hipercompetitividade, que resulta em reestruturação produtiva, relocalização industrial e fusões. Nesse contexto, a política neoliberal surge devido à necessidade de uma ideologia capaz de operacionalizar essas transformações.

Assim, as relações produtivas estabelecidas na configuração da acumulação flexível são caracterizadas pelo sintoma do risco e da incerteza, e a flexibilidade se torna uma exigência. Desse modo, o sistema capitalista contemporâneo exige trabalhadores que estejam dispostos a assumir o risco, sem calcular as consequências da incerteza.

Consequentemente, essa forma de ser flexível é um facilitador para casos velados de exploração do trabalhador, pois pessoas que estão em condições de pobreza e não tem consciência de seus direitos como trabalhador se submetem a trabalhos nos quais assume-se esse risco. O risco, muitas vezes, consiste na violação de direitos trabalhistas, como ocorre em muitos casos atuais nas empresas de delivery e a precarização do trabalho realizado pelos os entregadores de comida.

Um exemplo disso é o caso do paulista Thiago de Jesus Dias, entregador da Rappi, que ao realizar uma entrega num dia frio em que já trabalhava há horas, chegou no prédio do cliente com dores e mal estar. Quando foi notificado para a empresa a situação de Thiago, a resposta foi a solicitação para que a cliente desse baixa no pedido, para que pudessem avisar os outros clientes que as entregas não seriam realizadas, sem nenhum sensibilidade com o entregador. E somente depois de horas a família de Thiago conseguiu uma maneira de levá-lo ao hospital, mas a condição já estava em um estado grave, e ele morreu por morte encefálica na manhã do dia seguinte. 

Thiago era um entre vários entregadores de aplicativos de delivery que se submetem à longas horas de trabalho por dia, em condições precárias, assumindo o tal do risco proposto pela configuração de trabalho atual. Infelizmente, no caso dele o risco teve um resultado trágico. 

É possível analisar através da análise marxista a dualidade no caso entre empresa e trabalhador, sendo a primeira que obtém o lucro e enriquece a partir da força de trabalho do segundo, que assume os riscos e incertezas de uma relação de trabalho pautada na flexibilidade. Além disso, é questionável os limites permitidos dos tais riscos na sociedade contemporânea, sendo que muitas vezes há violação de direitos humanos sem a penalização adequada dos responsáveis envolvidos.


Pedro de Miranda Cozac - Direito Matutino


Fontes:

SENNETT, Richard. A Corrosão do Caráter: consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo. 14ª Ed. Rio de Janeiro: Record, 2009


    MAIA, Dhiego. Entregador do Rappi passa mal, é ignorado por empresa, Uber e Samu e morre em SP. Folha de São Paulo, São Paulo, 11 de julho de.2019. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2019/07/entregador-do-rappi-passa-mal-e-ignorado-por-empresa-uber-e-samu-e-morre-em-sp.shtml

Aplicabilidade das ideias de Karl Marx e Engels na atualidade.

  Influenciado pelo socialismo utópico, idealismo alemão e a economia política inglesa, Karl Marx e Friedrich Engels são considerados um dos pensadores mais influentes da modernidade, isso se deve principalmente pela aplicação de suas teorias, as quais podem ser utilizadas para compreender, não só o passado, mas também a atualidade.

 A principal teoria/método elaborado por eles é o materialismo histórico dialético, que engloba aspectos políticos, econômicos e sociais. Essa teoria parte da tese de que a produção é a base de toda a ordem social, ou seja, aqueles que dominam os meios de produção, os burgueses, moldam a sociedade através de sua ideologia. Isso pode ser refletido no modelo de Estado atual, o qual cada vez mais flexibiliza os direitos dos trabalhadores em prol do sistema econômico.

 Ademais, para Karl Marx as contradições internas da sociedade e a luta de classe transformam a realidade. Durante a história da humanidade, os modos de produção foram se alterando devido essa transformação. Atualmente, a acumulação flexível, permite ainda mais a dinamização da produção, pois as grandes empresas transnacionais conseguem produzir em lugares mais baratos, mas também vender para o resto do mundo. Esse novo método de produção necessitou de uma ideologia capaz de operacionalizar essas novas transformações no âmbito político e econômico, o neoliberalismo.

 Dessa forma, o método e as teorias de Karl Marx e Friedrich Engels possuem aplicabilidade até os dias de hoje, seja através no desenvolvimento de pesquisas científicas ou até mesmo para compreender melhor a realidade.

  

Rafael Enzo Yamada- 1 ano diurno

 

Crítica por crítica

Receita para se tornar um comunista (Receita fácil e rápida)

Ingredientes:

Um smartphone

Uma porção de tempo livre

Uma internet banda larga paga pelo pai

De 3 a 4 frases de efeito criticando o sistema de produção sem qualquer aprofundamento teórico (caso não tenha, você pode substituir por páginas e blogs sensacionalista da “esquerda cirandeira”).

 

Modo de preparo:

Utilize o tempo livre e a banda larga para acessar sua rede social com um smartphone. (Rede social a gosto)

Entre em uma discussão acalorada sobre política e vá levemente salpicando as frases de efeito.

Aguarde uns minutinhos até que um eleitor oposicionista fanático apareça e te acuse de comunista.

Prontinho! Seu prato está pronto e rende de uma a duas notificações.  Agora se você deseja uma receita completa e elabora, basta conferir abaixo. Fique com a gente!

 

Ingredientes:

Uma porção de leituras sobre sociologia

Uma porção de leituras sobre filosofia

Uma porção de leituras sobre história

Uma dose de compreensão da teoria clássica do capitalismo

Um keynesianista

Um liberalista

Uma colher de sopa de uma jornada de trabalho de um proletário comum


Modo de preparo:

Misture bem por algumas décadas a sociologia, filosofia e história em um recipiente e reserve.

Em uma panela funda você irá adicionar a teoria clássica do capitalismo, deixando cozinhar em fogo baixo enquanto acontecem algumas guerras e recessões econômicas. Não se esqueça de mexer de tempos em tempos adicionando pitadas de keynesianismo e liberalismo até o conhecimento engrossar.

Quando o caldo estiver grosso, você irá adicionar o conteúdo do recipiente anterior na panela e aumentar o fogo. Observe atentamente como um ingrediente interage com o outro, reconhecendo seus pontos fortes e falhas para compreender o estágio que se encontra.

Vá lentamente adicionando a colher de sopa de uma jornada de trabalho pra conferir materialidade ao prato. Não coloque em excesso senão pode azedar e causar o maior desconforto.

Prontinho! Você tem um prato completo de comunista!

A dinâmica de incertezas no mundo moderno

Richard Sennett, autor contemporâneo como fortes influencias marxistas trouxe em sua obra uma visão do materialismo histórico dialético. Esse detalhando a mudança na forma de produção devido a evolução tecnológica e a necessidade de otimização do tempo de trabalho e de suas relações na sociedade moderna. Essa mudança no padrão de funcionamento laboral que tem como conseqüência a mudança de pessoas por maquinas, ou seja, passa a ser mais necessária uma mão de obra rápida e automatizada em detrimento do trabalhador, que se vê forçado a exercer uma função muito mais desgastante para que possa ficar nessa competição com a tecnologia

Nesse âmbito laboral, as rotinas alem de exaustivas ficam carregadas de incertezas, devido à instabilidade e dificuldade de se firmar no mercado, visto que a falta da produtividade pode ocasionar a perda de seu sustento. Essa instabilidade não está apenas nos setores industriais ou em grandes escritórios, mas sim em novos trabalhos que surgiram com o advento da modernidade, como é o caso de entregadores e motoristas de aplicativos, que são pertencentes a uma das classes que mais sofrem com essa flexibilização do trabalho, devido a variação de salários, falta de seguros e de relação de trabalho com os seus empregadores.

Nesse contexto há quem defenda que essa modificação pode trazer uma maior qualidade nas funções do trabalhados para com o cliente, entretanto esse fato não passa de uma ilusão na qual são quebradas as formas tradicionais de trabalho, visando apenas o lucro de grandes empresários. Essa alteração muda a estrutura que separa de forma saudável a vida do trabalhador que por sua vez deixa de dividir sua vida entre trabalho, família e lazer, passando apenas a exercer a função de empregado, independente do dia, hora e lugar, colocando em risco sua qualidade de vida em função do seu emprego.

Por final exercício não atenua a forma cíclica da crise capitalista que sempre ocorre, como citado por Marx, mas se acentua devido a tamanhas incertezas. Assim passa a atuar fortemente, afetando a dinâmica psicológica desses indivíduos, ficando totalmente imersos na sua função laboral, abdicando dos seus próprios direitos para não acabarem mais as margens da sociedade, ainda assim correndo riscos de não trazerem o sustento para as suas famílias, mesmo trabalhando sete dias por semana.

 João Henrique Parreira – Direito Matutino

COVID-19 como catalisadora das contradições capitalistas

Karl Marx e Friedrich Engels, submersos nos estudos das contradições sociais causadas pelo industrialismo europeu do século XIX, compreenderam desde cedo que as crises econômicas, mesmo que catalisadas por fatores externos, são expressões de profundas incoerências de uma organização social baseada na economia de mercado. Eles entenderam que os desequilíbrios sociais eram consequências da lógica capitalista de acumulação sem fim de valor, que tem como principais proposições a necessidade de exploração do trabalho e a intensa dinâmica de circulação global do capital.

Principalmente no início da atual crise sanitária mundial, causada pela COVID-19, em várias partes do mundo, a produção de bens variados estagnou e a circulação de mercadorias acabou por se restringir, afetando a dinâmica do grande sistema de circulação de riqueza capitalista, o que resultou numa crise econômica global. Porém, pode-se afirmar que o coronavírus foi o gatilho, partindo de uma análise marxista da realidade contemporânea, que trouxe à tona de modo mais vívido os problemas estruturais causados pela lógica capitalista atual. Com isso, não se pode esquecer que, em um passado recente, o mundo já vinha sendo palco de diversas atribulações causadas, por exemplo, por dívidas estatais crescentes, pela dependência das empresas para com os mercados financeiros, também pelo inchaço da “macroestrutura financeira”, as inflações desenfreadas, o endividamento dos consumidores, e mais recentemente pelos conflitos econômicos dos dois maiores protagonistas mundiais: Estados Unidos e China. O que evidentemente se intensificou de maneira negativa no atual panorama.

Portanto, depreende-se que enquanto perdurar tal lógica de organização social burguesa, as problemáticas – sejam elas econômicas, sociais ou culturais – continuarão a ser realidade, e vez ou outra serão fomentadas e impulsionadas por adversidades, sejam elas previsíveis ou não, como é o caso da recente disseminação da COVID-19.

Educadores, uni-vos!

Um dos temas centrais do método marxista versa sobre a relação estabelecida entre sujeito e objeto. Fala-se a respeito da necessidade de o pesquisador ser um sujeito rico para uma análise adequada. Uma das formas de se enriquecer é através do conhecimento da cultura que certa pessoa está inserida em determinado momento histórico. Para esse método, a arte, por exemplo, pode ser considerada uma forma válida para ser utilizada na compreensão de algum fenômeno. É a compreensão de que se deve estudar a realidade sem, necessariamente, fracionar seus dados em caixinhas conforme o campo do conhecimento, - uma ideia defendida por Descartes em “O Discurso do método”- e que é preciso levar em consideração outros elementos, já que há sempre a adoção de uma perspectiva de classe que influi na posição ideológica relativa àquilo que está sendo estudado. Assim como Engels e Marx se aproveitaram de diversos elementos literários em seus escritos e optaram em escrever sobre a classe trabalhadora no meio da classe trabalhadora, existem pessoas que estão se aproveitando de elementos “vulgares” como finalidade pedagógica para explicar as obras e posicionamentos de diferentes pensadores.

Um dos vídeos que mais chamaram a atenção nos últimos meses, foi produzido no YouTube e postado em um canal chamado “Audino vilão”, em que seu idealizador, Marcelo Marques, jovem estudante de História de 19 anos, apresenta o pensamento de diversos filósofos e outros intelectuais importantes como Aristóteles, Maquiavel e Nietzsche, por meio de gírias paulistas e usando a aplicação de exemplos atuais para os jovens da periferia possam compreender melhor personalidades históricas famosas que produziram obras consideradas difíceis e herméticas para muitos. É uma forma de adaptar e disseminar ideias importantes para grupos periféricos que geralmente foram alijados de processos educacionais verdadeiramente enriquecedores, eficientes e libertadores. Para Marcelo, que comparou Aristóteles a um coach, chamou o Príncipe de Maquiavel de pilantra e disse que Nietzsche era “o famoso roba brisa”, o seu trabalho está muito ligado a ideia que “a demanda por filosofia não é demanda de classe social, mas da humanidade.”

O mais interessante é que um dos vídeos mais famosos trata justamente de Marx e Engels. Ele explica que o conceito de “coletivização” é: “a favela indo pra cima, falando que é nóis que manda, nóis que vai produzir e poucas ideia”. Ele explica a mais valia usando como exemplo as entregas de comida via aplicativos como IFood e Uber Eats pelos motoboys da “quebrada”: “[Mais valia] é você ganhar 5 conto pra fazer a entrega sozinho, do que vc ir lá, ganhar 3 real e ficar 2 pro mano do aplicativo. Mais valia é você ir no seu corre sozinho, e fazer por você do que você deixar os outro tirar o dinheiro que é seu”. Por mais que a abordagem pedagógica de “Audino vilão” não seja perfeita, ela pode ser vista com bons olhos, conforme o historiador Leandro Karnal disse para o próprio Audino em uma live em seu canal no YouTube: “Certamente dá pra debater muito, mas a atual maneira de pensar história e filosofia está reforçando a sociedade excludente, racista, preconceituosa e tá dando no que deu. Então, temos que pensar em algo diferente. Eu acho que você deveria ser debatido no plano nacional curricular.”

O trabalho de “Audino vilão” é importante porque ele levanta algumas questões importantes que estão relacionadas com a ideia trazida por Richard Sennett em sua obra “A corrosão do caráter”: o pensamento e “forma de ser” da classe dominante é o pensamento e “forma de ser” dominante na sociedade. Como a produção intelectual e acadêmica geralmente acaba se relacionando diretamente com a classe dominante da sociedade – seja pela contratação de egressos de universidades de ponta por grandes empresas ou até mesmo pelo financiamento privado em alguns setores de pesquisa ao redor do planeta - é natural que a produção de professores, por estarem inseridos na academia e, por extensão, em uma sociedade dominada por visões de mundo burguesas, mimetize as estruturas arcaicas de transmissão do conhecimento. Dessa forma, quando muitos se deparam com exemplos trazidos por alguém que ousa romper com os moldes tradicionais de aula, é previsível críticas relacionadas a variação linguística muito presente na periferia e exemplos que carecem de precisão técnica. Seria importante que os críticos de “Audino vilão”, ao falarem sobre o trabalho do jovem professor, considerassem os aspectos positivos de seu trabalho não só porque ele ajuda diversas pessoas, especialmente as mais jovens e pertencentes a classes sociais mais periféricas, na compreensão de pensadores importantes na formação de um ser humano com um maior senso crítico, mas também porque ele integra saberes – conhecimento acadêmico e realidade social – e, através dessa complexidade, ajuda na construção de um processo educacional de eficiente para o país.

 

DIOGO PERES TEIXEIRA – 1º ANO MATUTINO


Orgulho Violinista

Anseio pela tua visita 

Aguardo-te quando puderes 

Dedico-te a minha escrita 

Em cento e oitenta caracteres 

 

Amo-te à moda irrestrita 

Quero-te quando me queres 

Liberalizamos não só a economia: 

Amo-te à moda célere 

 

Guardo-te toda e qualquer quantia 

Para que, em junho, nosso amor prospere 

Ao estamparmos a capa da revista 

E ao liquidarmos um orgulho premiere 

 

Em Higienópolis, na Santa Cecília 

Alimentemos a opressão que antecede 

A honra capitalizada, a colorida ufania 

Mas não aquele por quem a C&A não intercede 

 

A nós nos basta o arco-íris na Avenida Paulista 

E a emancipação de custear um orgulho violinista 

E o motivo todo mundo já conhece:

É que o de cima sobe, e o de baixo desce.  


— Luiz Gustavo Couto de Oliveira. 

XXXVII Noturno

Uma Analise Materialista da Contemporaneidade

 

A flexibilização do capitalismo é a realidade do atual contexto socioeconômico mundial. Isso ocorre de forma que os mecanismos conquistados, historicamente, para proteger o trabalhador da exploração estão sendo cada vez mais desintegrados. Por exemplo, a tendência à terceirização da mão de obra, o desmembramento da legislação trabalhista, a reforma na previdência, entre outros, são fatores que capacitam cada vez mais a concentração de renda pela elite econômica, em detrimento da desvalorização e precarização da classe trabalhadora.

Visto isso, faz-se necessária a utilização da concepção marxista do “materialismo histórico” para que possamos obter uma compreensão clara acerca da realidade em que estamos inseridos e seu contexto de flexibilização das relações de trabalho. Karl Marx, por meio da obra “O Capital”, discorre sobre a ideia de que só é possível compreender as relações sociais da atualidade se e, somente se, fizermos uma análise crítica do sistema socioeconômico vigente, de como ele se estabeleceu, quais os conflitos sociais que gera e como se dão as transformações ocorridas na sociedade a partir dele.

Para isso, Marx faz uma analise do capitalismo industrial inglês no século XIX e, a partir dela, afirma que a história do homem se faz de acordo com a luta de classes e as mudanças sociais que ela gera. Deste modo, analisa que o sistema de acumulação e exploração da classe trabalhadora pelos capitalistas se sustenta pela alienação dessa mesma classe. Isso significa, que enquanto os trabalhadores não estiverem sóbrios para sua posição prejudicada no sistema e não se unirem em prol da luta social por condições mais justas e iguais nas relações trabalhistas que estão inseridos, não haverá mudanças estruturais e continuarão a serem explorados e oprimidos.

Terminada essa abordagem, cito, agora, o livro “A Corrosão do Caráter”, de Richard Sannett; obra contemporânea que foi publicada no ano de 1998. Nessa obra, Sannett traz a visão de Rico, um proletário alienado pela mentalidade capitalista, acostumado e adaptado ao descaso estatal e à falta de direitos. Percebemos, ainda, a existência forte de uma lógica individualista e “meritocrática” para obtenção do sucesso e, somada a essa, a perda dos valores fraternais. Isso só reafirma a visão marxista a respeito da efetividade da mudança estar atrelada à sobriedade da classe trabalhadora para sua realidade opressiva.

Dessa forma, é notável a importância do ideário marxista para desfazer a alienação dos proletários e mobiliza-los em prol da luta pela justiça, pela igualdade nas relações sociais e de trabalho. É importante, ademais, a percepção dessas condições para os demais setores da sociedade capitalista contemporânea, pois, apenas dessa maneira, será possível desestabilizar a visão meritocrática (irreal) de ascensão social pelo trabalho, quando não há qualquer tipo de alicerce para isso. Destarte, para finalizar, afirmo que esses alicerces estão, exatamente, no movimento contrário ao atual, de flexibilização geral; ou seja, na existência de uma legislação trabalhista que garanta condições mínimas (de uma vida digna) ao trabalhador, na deslegalização da terceirização e na formulação de uma previdência justa.


Thales Goulart                                                       Direito - 1Ano - Diurno