segunda-feira, 9 de março de 2020

"Penso, logo existo" ou "acredito, logo estou certo"?


A discussão a respeito das filosofias de Descartes e Bacon na contemporaneidade se mostra extremamente necessária. O motivo seria que, principalmente a partir do século XXI, a busca da verdade passa por um momento de crise.
Um dos indicadores desse fato seria o aumento em 2000% do uso do termo “pós-verdade” na Internet em 2016, ano em ele foi considerado como “Palavra do ano” pelo “Oxford Dictionaries”, departamento da Universidade de Oxford responsável pela elaboração de dicionários que elege anualmente uma palavra para a língua inglesa.
De acordo com o próprio “Oxford Dictionaries”: a “’Pós-verdade’ deixou de ser um termo periférico para se tornar central no comentário político, agora frequentemente usado por grandes publicações sem a necessidade de esclarecimento ou definição em suas manchetes”.
Ou seja, a “pós-verdade” está intimamente relacionada com a disseminação de notícias falsas (ou “Fake News”) em diversos meio virtuais com o intuito de favorecer determinados grupos políticos ou de impor alguma visão de mundo sobre o leitor usando argumentos falaciosos e dados manipulados ou mentirosos.
E qual seria a relação de Bacon e Descartes com o século XXI no que se diz respeito à busca da verdade?
Esses dois pensadores propuseram métodos racionais para que possamos alcançar um conhecimento verdadeiro. Por mais que hajam diferenças nos modos de pensar dos dois autores, ambos são nomes extremamente importantes no que ficou conhecido como “Revolução científica”, ou seja, a partir da Idade Moderna a produção do conhecimento passou a se vincular a formas empíricas de se constatar os fatos. No entanto, é justamente a ausência dessa reflexão sobre a realidade atual por grande parcela da sociedade que permite a disseminação das “Fake News”, por exemplo. É possível, inclusive, usar algumas ideias defendidas por Bacon e Descartes como crítica e como uma maneira de minimizar os impactos da pós-verdade, tomando cuidado apenas para que não caiamos em anacronismos.
Na obra de Francis Bacon, “Novum Organum”, no aforismo XII, temos que: “A lógica tal como é hoje usada mais vale para consolidar e perpetuar erros, fundados em noções vulgares, que para a indagação da verdade, de sorte que é mais danosa que útil”. Podemos entender essa ideia usando como exemplo o compartilhamento de notícias falsas advindas de fontes únicas e que possuem algum viés ideológico marcado pelas pessoas que a recebem, deixando a “indagação da verdade” em segundo plano. É preciso que abandonemos o subjetivismo.
Já na obra cartesiana “O discurso do método”, na parte 4, Descartes escreve que é preciso “rejeitar como totalmente falso tudo aquilo em que pudesse supor a menor dúvida”. Essa afirmação pode ser observada como um dos passos de seu método que, assim como Bacon, objetiva encontrar a verdade. Caso ela fosse largamente aplicada ao contexto da pós-verdade, teríamos uma redução significativa do impacto desse fenômeno em variadas áreas, como a política, por exemplo.
É importante ressaltar que quando falamos sobre os impactos da circulação de mentiras na política (fenômeno inerente a pós-verdade), no entanto, o pensador que mais escreveu sobre isso não foi Bacon, Descartes nem nenhum outro pensador contemporâneo. Em sua obra “A república”, Platão defende a prevalência da verdade dentro da política como um fato importantíssimo, já que “uma sociedade que aplaude a sistemática decisão política em distanciamento progressivo da complexidade da busca da verdade, é uma sociedade que cava sua própria sepultura”.

DIOGO PERES TEIXEIRA - DIREITO 1º ANO - MATUTINO

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