sábado, 31 de agosto de 2019

O Sul e o Norte Social


A questão agrária sempre gerou polêmica, principalmente no Brasil, país no qual a maior porção de terras produtivas está na mão de latifundiários e grandes fazendeiros. Entende-se que essa matéria vem desde o século XVI, quando a Coroa implantou as capitanias hereditárias, sistema no qual permitia que particulares explorassem uma enorme área. Todavia, esse problema de concentração de terras foi agravado com a criação da Lei te Terras de 1850, que tornou o solo uma moeda de troca, sendo, portanto, símbolo de poder e acentuando desigualdades fundiárias. Percebe-se, dessa maneira, que o acesso a terra no Brasil sempre foi dificultoso, criando, então, um monopólio de latifúndios.
Todavia, devido esse acumulo exagerado, há muitas terras que permanecem, propositalmente, improdutivas, aumentando cada vez mais a miséria no campo. Com isso, movimentos foram criados para combater esses abusos, como o MST, que ocupa áreas particulares consideradas improdutivas. Com isso, foram gerados inúmeros conflitos judiciais entre fazendeiros e trabalhadores do campo pela posse fundiária.
Um exemplo desse impasse é o julgado de 2001 realizado em Passos Fundo – RS, na Fazenda Primavera. De acordo com o processo, participantes do movimento do MST invadiram áreas particulares, assim, o proprietário reclamava por reintegração de posse. No entanto, a decisão judicial foi contra esse pedido, tornando-se, assim, uma resolução histórica por ir contra a hegemonia latifundiária. Alegou-se que a propriedade não apresentava os requisitos necessários para provar a sua produtividade, sendo que de acordo com o artigo 186 da Constituição Federal de 1988, toda propriedade deve cumprir a sua função social.
Esse fenômeno extraordinário pode ser entendido e relacionado através da percepção de Sara Araújo. Segundo a investigadora, não existe uma isonomia entre as pessoas, dessa forma, o direito deve ser emancipatório e não reforçador dessas diferenças.  Nota-se, portanto, que os integrantes do MST representam, de forma análoga ao pensamento de Araújo, o Sul social, já que eles são socialmente e juridicamente excluídos e os fazendeiros o Norte que por fazerem parte da elite social são juridicamente representados e por isso geralmente apenas os seus anseios são atendidos. Desse modo, percebe-se o peso desse julgado para a autonomia do direito, uma vez que ele reduziu as exclusões abissais a partir do momento que o sul foi exaltado.
Por conseguinte, conclui-se que o direito é uma ciência complexa que pode ser analisada de diversas maneiras, ele pode ser, portanto, conservador ou libertador. O julgado representa essa emancipação, já que garante representatividade para os socialmente invisíveis.

Laura Santos Pereira de Castro - Direito Matutino

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