domingo, 9 de junho de 2019

Solidez racional-formal do Direito: anacronismo ou visão atemporal?


Segundo Weber, o pensamento de constrói sob diferentes técnicas de racionalização, sendo classificadas em racionalidade formal, que se estabelece mediante cálculo de ações e efeitos. Material, que leva em conta os valores e morais da situação concreta, teórica e prática.

Em direito a racionalização pende entre o material e o formal, assim, poder-se-ia aproximar a racionalidade formal de um direito autônomo e independente na visão neo-constitucionalista. A racionalidade material, por outro lado, se aproximaria daquilo que Lenio Streck chama de Panpricipiologismo, ou seja, a fundação de princípios sem normatividade, normalmente sob argumentação política, econômica ou moral, com o fim de fundamentar decisões judiciais.

Na análise weberiana, o alto grau de racionalismo formalista do direito sistematicamente estatuído e aplicado por juristas especializados baseia-se em cinco postulados básicos. A sua observância garantiria a solidez racional-formal do direito e, como consequência, sua autonomia em relação às outras esferas de ação. Tais postulados são:

O trabalho jurídico atual [...] parte dos seguintes postulados: 1) que toda decisão jurídica concreta seja a “aplicação” de uma disposição jurídica abstrata a uma “constelação de fatos” concreta: 2) que para toda constelação de fatos concreta deva ser possível encontrar, com os meios da lógica jurídica, uma decisão a partir das vigentes disposições jurídicas abstratas; 3) que, portanto, o direito objetivo vigente deva constituir um sistema “sem lacunas” de disposições jurídicas ou conter tal sistema em estado latente, ou pelo menos ser tratado como tal para os fins da aplicação do direito; 4) que aquilo que, do ponto de vista jurídico, não pode ser “construído” de modo racional também não seja relevante para o direito; 5) que a ação social das pessoas seja sempre interpretada como “aplicação” ou “execução” ou, ao contrário, como “infração” de disposições jurídicas [...], isto porque, de modo correspondente à ausência de lacunas no sistema jurídico, também a “situação jurídica ordenada” seria uma categoria básica de todo acontecer social.

Os atuais defensores da autonomia do Direito e do que chamamos pós-positivismo jurídico, no entanto, criticariam alguns desses postulados. Quanto ao primeiro, juristas pós-positivistas vêm criticando o deducionismo legalista, pregando uma interpretação amparada nos Direitos Fundamentais e em princípios constitucionais sólidos.  O segundo postulado, relacionado ao terceiro, de que todo fato deveria encontrar uma decisão, dá espaço para o uso de analogias, na tentativa de descobrir uma norma oculta e evitar lacunas, isso leva a um maior espaço para a discricionariedade do juiz, que transforma o Direito na sua interpretação daí a crítica: “O Direito é o que os tribunais dizem que é? ”. O quarto postulado, de que não poderia ser construído, do ponto de vista jurídico, aquilo que não pudesse ser construído, também, de forma racional, isso, na visão dos neo-constitucionalistas cria um aprisionamento da lei que leva ao “império da vontade”. O quinto e último postulado remete novamente à busca pela ausência de lacunas, considerando a situação jurídica ordenada como categoria básica do acontecer social, tal postulado foi usado como justificativa para o aumento das codificações, o que afastou o direito de sua base constitucional, sendo duramente criticado pelos pós-positivistas.

Por conseguinte, pode se afirmar que Weber analisou corretamente o que chamamos de jus positivismo, porém, os postulados que ele levanta para a racionalização do Direito são, atualmente, vistos como uma patologia da qual o Direito Contemporâneo tem o dever de escapar. Talvez Weber tenha realmente fornecido uma visão atemporal do Direito e os Pós-positivistas estejam apenas lutando contra a realidade. Por outro lado, é possível que os juristas contemporâneos realmente tenham mudado a forma de pensar o direito, tornando a análise de Weber ultrapassada. A verdade, só o tempo dirá.

Pedro Augusto Ferreira Bisinotto
Direito-Noturno

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