domingo, 5 de maio de 2019

Jean Calas: Vítima do Fanatismo, do Magistrado, do Fato.


    A França, em meio ao século XVIII, detinha o catolicismo como religião oficial do Estado e, consequentemente, predominava-se a fé institucionalizada dentre a sociedade. Entretanto, o protestantismo já se anunciava em território gálico, adquirindo simpatizantes e seguidores. A profissão desta, por sua vez, era tímida e comumente restrita ao âmbito privado, visto a ampla perseguição – populacional e estatal – perante a grupos classificados como hereges.
    É nesse contexto que se instaura, em meio ao fanatismo, a trágica condenação de Jean Calas. Negociante e adepto da doutrina protestante, como o restante de sua família – exceto por seu filho Louis, Calas vivenciou o suicídio de um de seus próprios filhos: Marc-Antoine. A tormenta, no entanto, estaria apenas em seu começo. Diante do acontecimento, a multidão que se reunira em torno da residência do negociante, incitando palavras de intolerância e disseminando rumores que, com base na repetição do povo, tornaram-se a nova realidade. Jean Calas, sua família e o amigo de Marc-Antoine, haviam reunido forças – de acordo com o agrupamento que se encontrava frente a residência – e estrangulado o filho, o irmão, o amigo. O motivo? Supostamente, Marc planejava abjurar-se da heresia e converter-se ao catolicismo, o que provocou ojeriza aos entes familiares.
    Nesse ínterim, os cidadãos de Toulouse, assim como a maioria dos magistrados responsáveis pelo caso, encontravam-se convencidos, a partir de rumores, que os envolvidos eram culpados. A pena maior incidiu sobre Jean Calas, torturado e executado em público. Objetivo, ao ressaltar essa passagem histórica, exemplificar a vigência do Fato Social durkheimiano, presente, tanto no período anterior a existência do sociólogo, quanto no panorama contemporâneo.
   O fanatismo, embasado numa moral católica deturpada, promoveu a morte de um homem inocente, mas isso não seria possível sem que a fé atendesse os critérios inerentes ao Fato Social. A coercitividade, imposta ao corpo social por dois meios, o Estado – que oficializara a religião – e a população, que realiza um processo de autovigilância constante, julgando e condenando os díspares na própria órbita social. O status de generalidade, visto que a parcela populacional majoritária professava a religião católica. A exterioridade, decisiva, impediu com que as normas, uma parcela minoritária da magistratura e a própria razão fossem inúteis perante a inércia da convicção.
     Ademais, as multidões - similares a do evento - representam, de acordo com Durkheim, o espaço nítido para a experimentação dos Fatos Sociais, onde esses se afloram, mas que seus participantes dificilmente tomam ciência durante sua ocorrência.
        Nas palavras de François-Marie Arouet (1763, p. 9)
Onde o perigo e as vantagens são iguais, o espanto cessa e até mesmo a piedade se enfraquece; porém, se um pai de família inocente é entregue às mãos do erro, da paixão ou do fanatismo; se a única defesa do acusado é sua própria virtude; se o único risco que os árbitros de sua vida correm ao matá-lo é o de cometerem um engano; se eles podem matar impunemente mediante uma sentença, então o protesto público se eleva, já que cada um teme por si mesmo, percebe que ninguém pode julgar sua vida em segurança perante um tribunal instituído para velar pela vida dos cidadãos e todas as vozes se reúnem para exigir vingança.

Caio Laprano (1º Ano - Noturno)

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