domingo, 13 de maio de 2018

Conflito de Racionalidades


O caso Pinheirinho trata da ocupação feita por pessoas desabrigadas em um terreno improdutivo em São José dos Campos. Os ocupadores viveram naquele ambiente por cerca de 8 anos até ter sido tomada a decisão judicial de reintegração de posse da propriedade à Massa Falida da empresa Selecta. O caso foi visto por muitos como uma grave afronta aos direitos humanos, devido à mobilização dos militares em retirar os moradores à força do local, fazendo uso da violência física e moral, demonstrando descaso em relação aos seus pertences e à própria integridade de cada um deles. 
Argumenta-se que a decisão foi legitimada fundamentando-se no direito à propriedade. Não obstante, a propriedade deve cumprir uma função social, conforme consta no inciso XXIII do artigo 5º da Constituição Federal de 1988. O terreno em questão encontrava-se improdutivo e desocupado, não contribuindo de forma alguma para o bem-estar geral da comunidade. Ademais, a Carta Magma brasileira também garante a todos o direito à moradia. Dessa forma, o desenrolar desse caso denuncia as mazelas do Estado referente à qualidade de vida da própria população, favorecendo os interesses de uma empresa que não cumpriu com as obrigações referentes ao terreno e que não fez o requerimento para reintegração dentro do prazo previsto em detrimento de milhares de famílias desabrigadas e fragilizadas pelo próprio sistema.
Segundo Max Weber, para a consagração da racionalidade dentro do Direito, é fundamental eliminar individualismos e classicismos. No caso retratado, isso não ocorreu, considerando que os moradores levaram desvantagem por não possuir condições financeiras de recorrer à Justiça em busca de seus direitos, bem como provavelmente não tinham acesso ao conhecimento profundo das leis para poder exigir seu cumprimento. Em contrapartida, a empresa encontrava-se em posição vantajosa pelas condições econômicas e pela influência exercida. Ocorre também o que Weber chamaria de materialização de valores, em que os interesses da classe dominante adquire forma, visando uma forma de exercer a dominação através do Direito.
Esse conflito de interesses ocorre devido ao fato de haver uma multiplicidade de racionalidades, de forma que classes distintas detêm modos de conduta e ideologia divergentes. Gera-se, conforme o pensamento de Weber, uma busca incessante pela concretização da racionalidade. Contudo, o Direito não se torna racionalidade como prática, mas apenas como abstração. Sendo assim, o sentimento de justiça o qual surge espontaneamente na população deveria prevalecer em relação ao Direito criado artificialmente, utilizado, nesse aspecto, para ferir a dignidade de milhares de famílias desamparadas.
Logo, é evidente a injustiça presente no caso Pinheirinho. O pensamento de Weber pôde ser exemplificado através da disputa de racionalidades, expressada através de um conflito de interesses em que a classe dominante predominou. É indubitável a limitação do acesso à justiça, de forma que os indivíduos prejudicados possuíam certo desconhecimento da lei e não possuíam condições para bancar uma defesa. Assim, eles permaneceram presos numa situação extremamente desvantajosa e que representa uma perda para a sociedade como um todo, denunciando uma falha em priorizar os direitos humanos e o descaso estatal para com o elo mais fraco.


Valkíria Reis Nóbrega - Diurno

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