domingo, 26 de novembro de 2017

PEC 181 e ADPF 54: A dicotomia conservador-progressista presente nas instituições sociais.

No período dado como atual, faz-se presente comportamentos, muitas vezes esporádicos, conservadores a fim de uma prévia determinação de comportamentos sociais, determinando, assim, o que é concebido como certo ou errado. Vê-se, ainda, uma nova cadência que busca uma vigência de padrões de um intimo grupo social a determinar os conceitos morais. Logo, por consequência é de se notar a presença relativa de um avanço conservador – a se ignorar os conceitos econômicos – no pensamento majoritário da sociedade brasileira.
Em vista disso, questionamentos são elencados, muitas vezes diante de um dado discurso relativo entre o progressismo e o conservadorismo, a respeito do ditame da vida em sociedade, conceitos sobre certo e errado ou sobre os preceitos morais e valorativos que afirmam a vigência constitucional do ordenamento jurídico em associação com a sociedade. Tem-se como um destes, um tema de grande importância e relevância no cenário da modernidade, não só no Brasil como no mundo todo. Esse tema é o aborto.
Atualmente, a questão do aborto tem ultrapassado os limites que o delimita como uma questão criminal, que teria por infringir o conceito de vida. O aborto, passa, agora, a fazer parte das considerações pessoais de cada gestante – ou melhor, de cada mulher – como uma escolha que engloba tanto a respeito da liberdade de expressão como a questão de ter autonomia quanto ao seu próprio corpo. De antemão, o aborto é tipificado como conduta criminal no Código Penal dos artigos 124 ao 128, nessa diagramação normativa há diversas espécies de aborto a serem tratadas e associadas a penas privativas de liberdade.
Contudo, um fato primordial a ser levado em conta é o seguinte: o aborto não deixa de ser realizado só por ser tipificado como um crime, assim como assassinatos, latrocínios ou, até mesmo, a sonegação de impostos. Entretanto, em uma sociedade em que o aborto não é regulamentado, mas sim criminalizado ocorrerão casos de que, na clandestinidade, um alto número de mulheres sujeita-se a correr um grande risco de morte, visto que não há a devida regulamentação dos procedimentos e clinicas abortivas. Sendo assim, há inúmeros dados de países nos diversos continentes que adequaram o aborto e são satisfatórias as condições de vida dos habitantes em questão.
“Um estudo inédito da Organização Mundial da Saúde (OMS) concluiu que países com leis que proíbem o aborto não conseguiram frear a prática e que, hoje, contam com taxas acima daqueles locais onde o aborto é legalizado. Já nos países onde a prática é autorizada, ela foi acompanhada por uma ampla estratégia de planejamento familiar e acesso à saúde que levaram a uma queda substancial no número de abortos realizados.”
Diante da disposição dos fatos trabalhados, há no dado momento presente, em primeiro caso, a aprovação da PEC 181 que criminaliza os casos de abortos em que o feto é oriundo de estupro. Todavia, os resultados são oriundos de uma votação de 19 integrantes, onde 18 votaram a favor e apenas 1 integrante contra. Um fato de útil conhecimento é que apenas 1 integrante era mulher e votou, esta, de forma contrária.
Outro caso que envolve o aborto é a ADPF 54 que busca interpretar uma possível violação de preceitos fundamentais oriundos de uma inconstitucionalidade dada pela criminalização de abortos em casos de fetos anencefálicos. Esta um pouco menos atual do que a anterior, foi posta em questionamento no que tange sua constitucionalidade no STF, onde o resultado procedeu-se favorável perante o descumprimento de preceito fundamental.
Ambas situações foram determinadas por votos, de pessoas oriundas de diversos moldes sociais. Devido a isto, uma alusão sociológica, vinda do pensador francês Pierre Bourdieu, emerge em vista de todos os discorrimentos tratados. O conceito de habitus, mantendo-se no olhar legislador da PEC 181 ou no olhar que concerne ao judiciário na respectiva ADPF, o fato de como as pessoas que formam e delimitam padrões sociais, são influenciadas pela própria sociedade, podendo-se dizer: uma estrutura estruturante. A forma de se comportar segue padrões sociais e se delimitam devido as concepções, próprias, de vida de cada deputado que votou contra a referida PEC ou a cada ministro. Exemplo disso é que a única mulher da comissão votou contra, bem como a afamado voto feminista da Ministra Cármen Lúcia. O habitus, deste modo, se torna mais evidente, onde é possível delinear que: as aspirações sociais são transcendidas nas atitudes tomadas por elas. Os 18 deputados que participaram da PEC, por sua vez são de maioria evangélica, não obstante serem homens, são a maioria influenciados por vieses religiosos, que expressam um outro habitus, que como estrutura estruturante, influenciam a modulação da sociedade.
O capital cultural, também tratado por Bourdieu, se mostra como um fator importante nas determinantes formas de mudança social. A moeda de dominância, que se dá pela cultura implica na estratificação social velada. Ao se dar um maior foco a ADPF 54, ou em todos os casos que o STF atua, há uma distinção no comportamento, voto e ideal de cada ministro lá presente, com comportamentos que se expressam como culturalmente elitistas ou como mais simplórios, como as participações dos ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, respectivamente, devido ao fato sujeição de situações que cada um passou na vida.
As formas de pensamento em relação com o direito ao determinar a mudança social, apresentam-se como voláteis. O habitus faz-se real e presente nestas expressões sociais. Os operadores do direito partem da constituição dele, a partir da influência que sofreram com o tempo e sofrem cotidianamente, sendo um fator essencial para a transformação social. O Direito então, a Bourdieu, tende a divergir do que foi postulado por Hans Kelsen, como algo independente do social, como o direito puro; o direito, na verdade, por mais que seja estático, ele é adequado e modulado a sociedade, que não se encontra nas mesmas formas.

Em suma, o instrumento judiciário, no Brasil, tem como ultimo a definir os moldes legislativos, como algo constitucional ou não, devido ao seu controle de constitucionalidade. A diferença crucial entre a PEC 181 e a ADPF 54 é que a primeira se encontra no âmbito legislativo, e a segunda no âmbito jurídico. A dicotomia citada no início do texto, logo, faz-se presente devido a percepção de que há, uma vez que a ADPF 54 foi julgada procedente, a dicotomia entre conservadorismo e progressismo na realidade atual. O direito, entretanto, deve ser elucidado como mais importante, por em situações extremas poder dialogar e mudar uma consideração tomada no legislativo, e nesse caso o parecer que se elucida é de que há uma concepção liberal no poder judiciário que emana de constatações advindas dos preceitos individuais de cada um que forma o direito e em seu todo social constrói outra realidade. As demandas sociais, também, quando por necessidade devem ser satisfeitas pelo direito, fazem com que o próprio direito e seus operadores se tornem sujeitos a uma flexibilização, a fim de adequar-se a sociedade. O habitus se emana de forma velada na crença de cada ministro do que tem por ser como certo e errado, bem como nos intuitos de cada deputado.

Referência: http://saude.estadao.com.br/noticias/geral,paises-que-liberaram-aborto-tem-taxas-mais-baixas-de-casos-que-aqueles-que-o-proibem,10000050484

Pedro Henrique Lourenço Pereira - Matutino

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