segunda-feira, 23 de outubro de 2017

As cotas raciais diante da História e do Direito

            Sob uma perspectiva histórica, a atual questão racial no Brasil pode ser compreendida como uma herança colonial – que ainda encontra muita força para subsistir na nossa sociedade – que marca nossa população como um povo que, apesar de miscigenado, encontra brechas para exalar o preconceito e a exclusão social das minorias. No entanto, mesmo que o racismo esteja fortemente ligado ao regime escravocrata presente no Brasil até 1888, devemos compreender o porquê da população negra, nos dias de hoje, ainda sentir os resquícios desse regime. A História nos permite entender que a abolição da escravatura foi um processo que, incontestavelmente, teve extrema importância para a regulação de uma mudança social naquela época; entretanto, ela foi insuficiente, pois não foi capaz de alterar a real estrutura do país, que continuou marginalizando e violentando os negros devido à falta de uma política pública que os inserisse na sociedade depois de 300 anos de escravidão. Por isso a persistência da exclusão das minorias até hoje: não houve uma reparação, ainda naquela época, de todos os danos econômicos, sociais e políticos que os negros escravizados sofreram. Tudo isso está ligado a atual conjuntura social brasileira, ao nosso processo econômico e cultural.

            Diante desse quadro, Boaventura de Sousa Santos apresenta o Direito como um meio para a emancipação, visto que essa deve acontecer de acordo com a regulação, ou seja, sob a égide do Estado. Utilizando-se do direito como um instrumento para a revolução e mudança social, ligamos Boaventura ao STF, quando este último declarou válida e constitucional a adoção das cotas raciais nas universidades brasileiras; dessa forma, o direito e o Estado trabalham entre si a fim de regulamentar políticas necessárias à evolução da sociedade. Infelizmente, boa parcela da população acredita que as cotas apenas servem para reafirmar a ideia de uma segregação racial, tão indesejada pelos progressistas, ou para benefício de um grupo. No entanto, devemos deixar claro que ações afirmativas não têm o objetivo de privilegiar um grupo – visto que privilégio é o próprio fato de não precisar de uma política pública para sobreviver – e sim de corrigir situações que resultam na desigualdade. Para Boaventura e para o STF, as cotas são um instrumento inicial de mudança, mas não a mudança em si, visto que são políticas temporárias, pois espera-se que, um dia, elas não sejam mais necessárias, pois a igualdade de oportunidades será alcançada. Enquanto isso não acontece, as políticas públicas seguem sendo ferramentas essenciais para combater o desequilíbrio social, político e econômico existente na sociedade brasileira, assim como a propagação de ideais racistas contra tudo aquilo que não remete à “branquitude” europeia.  

Kelly Akemi Isikawa - 1º Diurno 

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