segunda-feira, 23 de outubro de 2017

A maldição de Cam 


Cam foi um personagem bíblico, filho de Noé. Segundo as escrituras, após o diluvio, Cam deparou-se com seu pai embriagado e nu, e ao invés de respeitá-lo, chamou seus irmãos para que pudessem se entreter com o ocorrido. Noé amaldiçoou seu filho, e segundo estudos religiosos, Cam teria se dirigido ao continente Africano, onde constituiu família e teve descendentes.

Religiosos utilizaram essa passagem da bíblia para justificar a escravidão africana, alegando que aqueles que nasceram no continente Africano eram amaldiçoados e por isso deveriam ser escravizados.  A cor da pele, portanto, passou a ser uma demonstração da marca dessa maldição. Vemos, portanto, que argumentos religiosos foram utilizados para que interesses econômicos e pessoais fossem alcançados, como por exemplo aquisição de mão de obra para a exploração de terras descobertas, tal como o povo europeu fez no território americano.

A história do Brasil, por exemplo, foi marcada por episódios de exploração sórdida e sangrenta do homem branco sobre o negro. Logo nos primórdios da colonização a mão de obra africana foi utilizada em larga escala para atender as necessidades do povo europeu no território brasileiro. Massacres, genocídios, estupros, humilhações, agressões e racismo foram inerentes ao desenvolvimento da história brasileira. Contudo, apesar da abolição da escravidão, a mentalidade escravocrata não foi extinto no país, e continuamos vivendo em tempos de preconceito explícito, segregação e a falta de recursos para a inserção social do povo negro.

Apesar da promulgação de leis como a Áurea, Ventre Livre e Sexagenários, pouco foi feito para que o negro fosse emancipado. Boa Ventura, em sua obra “Poderá o Direito ser Emancipatório?” analisa a questão de como o instrumento jurídico pode ajudar as minorias na aquisição de direitos, e constatamos que o autor conclui que há um impedimento institucional para que essas minorias possam ter participação política e ter seus direitos sociais assegurados.

Mas e as cotas raciais? Não constituem um instrumento para a integração do negro na sociedade? Na teoria sim, mas na verdade a cota é um instrumento fraco e que caminha a passos lentos para a igualdade de oportunidades e direitos. Vemos esse instrumento ser utilizado nas universidades mas seu efeito tem trazido poucos resultados contundentes. Apesar de vermos o público negro aumentando gradativamente nas instituições de ensino superior por intermédio da reserva de vagas, ainda constatamos um apartheid no mercado de trabalho, nas relações sociais e no âmbito econômico. O preconceito ainda está enraizado em nosso cotidiano, e as cotas solucionam uma parte mínima desse problema.


Dessa forma, vemos que a maldição de Cam persiste na atualidade, e que a segregação e o preconceito que eram argumentos religiosos respaldados pelas escrituras bíblicas continuam a existir na atualidade. As cotas devem existir, mas ainda é pouco comparado ao que se pode fazer para o negro seja emancipado de fato.



Wagner Galdino dos Santos , 1º ano, Direito Noturno 

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