segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Socialismo Nutella: Fetiche dos poderosos ou Consciência Social ?

Era uma vez Gregório Werneck, nascido no Leblon, filho de um casal de banqueiros,  cuja vida era muito confortável e luxuosa: acordava às 09:00 da manhã, o requintado café matinal – composto por pão integral, queijo de cabra, nutella e suco natural de pêssego – era servido por uma das dez empregadas da família – a qual raras vezes recebia um “obrigado”; posteriormente, partia para o banho na sua banheira de hidromassagem, depois jogava um playstation 4 na sala cinema, e, em seguida, o motorista – este nem bom dia ouvia –  o levava para escola, um tradicional colégio bilíngue da cidade, onde já ficava até meia noite estudando para o vestibular. Bons tempos, pensava ele, quando à noite sempre ia ao shopping ver algum filme ou comprar alguma roupa, mesmo que nunca a usasse, mas que não saísse de lá sem nada na mão...
Gregório era um privilegiado. Facilmente conseguiu ser aprovado no curso de Publicidade e Propaganda em uma excelente universidade pública. De início, achava muito estranho o estilo de vida universitário: todos andavam de bermuda e chinelo, tomavam a cerveja mais barata do botequinho mais fuleiro da esquina, conversavam horas e horas após a aula sobre Marx, Gramsci, Focault, ao som de Caetano Veloso e Chico Buarque... Lembrava que na escola mal dava atenção a esse filósofos, não era contra, mas eles não despertavam seu interesse... Às quintas e sábados,  ia para as festas, onde havia muita diversão, e só saía quando vomitasse e caísse no chão.
Estava vivendo um momento único na sua vida – mas fantástico! – sabia que não era o seu padrão de vida que havia decaído, mas era uma nova forma de encarar a realidade, pelo menos enquanto tivesse na faculdade. Ao chegar na mansão, não abria mão das mordomias que tinha... Não só ele, mas como quase todos da universidade, com exceção dos cotistas. Estes, muitas vezes por terem de trabalhar durante o dia ou não terem dinheiro sobrando, poucas vezes desfrutavam da vida acadêmica. Gregório mal conversava com eles.
Como Gregório era um rapaz bem boa praça, e para fazer uma média com a galera, logo entrou na vida política do câmpus: ingressou no centro acadêmico e de antemão já se prontificou a lutar pela continuação dos serviços de alimentação estudantil, o RU, apesar de achar a comida uma gororoba e nunca nem ter entrado no bandejão...
Depois, associou-se ao núcleo de estudos marxista da faculdade, para aperfeiçoar seu raso conhecimento e formar uma “consciência de classe” visando combater os opressores burgueses do grande capital. No entanto,  não achava que se encaixava nesse conceito, nem seus pais, que estavam respondendo a um processo por lavagem de dinheiro de políticos corruptos.
Ao dirigir seu BMW, lotava o carro de estudantes, todos brancos e bem de vida, ouvindo Negro Drama do Racionais e puxando um baseado para refletir melhor sobre os problemas sociais do Rio de Janeiro. Quando pararam no semáforo, veio uma criança descalça vendendo balas: eles nem abaixaram os vidros, deveria ser um desses trombadinhas que só querem dinheiro para comprar drogas... Não pensaram se era para juntar dinheiro para no jantar ter pelo menos alguma mistura, além da farinha....
Alguns dias depois, houve um evento sobre políticas públicas de inclusão social, e Gregório foi um dos organizadores. Foram convidados alguns estudantes de ensino médio de diversas comunidades. No dia, Gregório deu uma palestra impecável sobre a luta para inserção dos mais pobres nas universidades, no mercado formal de trabalho, na política. Tirou várias selfies com os estudantes, gravou um vídeo para o YouTube, mostrando-o, junto com seus colegas, como era caridoso e doava livros e materiais de cursinho para os alunos de baixa renda. Ganhou vários likes.
Já perto do final do evento, estava com muita raiva, pois esse bando de moleques “sem educação” ainda não haviam saído e estavam ocupando o espaço dos universitários, que queriam se reunir para debater as pautas do próximo protesto que fariam contra a reforma do ensino médio...
E, desse modo, Gregório e seus “parcas” levavam a romântica vida acadêmica, dedicada à revolução e em prol da classe operária, à base de muita cachaça, diversão, hipocrisia e pouca luta. Não se davam conta de que eram um bando de playboys mimados, fúteis, hipócritas que não entendiam nada da realidade da população humilde e apenas estavam brincando de revolucionários, pois não contribuíam em nada para melhorar a vida da população, ao contrário, só agiam com escárnio diante dela, como se fosse um verdadeiro tapa na cara, usando do ideal marxista como pano de fundo para ocultar a verdadeira face do grupo opressor. Como dizia o grande poeta Ferreira Gullar: “Quando ser de esquerda dava cadeia, ninguém era”.
Para explicar cientificamente esse comportamento de Gregório, negligenciando a realidade onde vive e tomando atitudes tão antagônicas às que era habituado, Durkheim aponta para o “fato social”, que por meio de instituições (ex: a universidade), costumes e valores (ex: a coletividade acadêmica e o viés marxista imbuído no excerto, respectivamente) influenciam o indivíduo de tal modo que suas atitudes são quase que premeditadas, tamanha coerção desses agentes. Contudo, mesmo assim essa teoria ainda deixa muito a desejar quanto à cara de pau de Gregório.


John R. Angelim Novais, 1º ano Direito Noturno.

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