domingo, 20 de agosto de 2017

A conversa entre J.J. Rousseau e E. Durkheim

Na inércia cósmica de um lugar desconhecido, cujo tempo não pode ser medido, Jean-Jacques Rousseau bate à porta de Émile. Após poucos segundos a porta abre-se e Jean pode cumprimentar o conhecido Émile Durkheim. Ambos se recolhem ao claustro para uma conversa informal:
            – O que fazes aqui, sr. Rousseau – indaga o dono do quarto, enquanto lustra com óleo seu cachimbo holandês, de costas a Jean.
            – Primeiramente, gostaria de me desculpar pelo incômodo que vos causo; não é minha intenção. Em segundo lugar, venho informar-vos que minha jornada à Terra começará em breve e o que eu tenho planejado para levar àquele mísero povo carece de algo que só o senhor pode ajudar – diz Jean, enquanto aponta uma poltrona no canto do quarto.
            Émile volta-se a Jean, com a cabeça afirma para que a visita possa se sentar na poltrona e com os dedos onustos de fumo responde:
            – Caro amigo, não gosto dessas nossas formalidades de tratamento; de agora em diante, portanto, tratamo-nos um ao outro com a segunda pessoa. Entristeço-me ao saber que partirás tão cedo – era frequente o encontro de ambos para conversas amistosas – alegro-me, no entanto, ao saber que poderás contribuir com seu conhecimento para o desenvolvimento terreno. Pois bem, como poderia ajudar-te?
            – Com minha observação do povo que na Terra habita, consegui distinguir que os Estados vêm se formando e não possuem uma explicação de seu funcionamento nem de sua origem. Venho, pois, com minha teoria. Lembraste do Estado de Natureza que te contei semanas atrás? – Durkheim afirma positivamente meneando sua cabeça enquanto traga seu cachimbo – Pois bem, estão surgindo os Estados Civis. O que não é sabido, ainda, é o motivo de seu surgimento: os conflitos do Estado de Natureza acrescido do Pacto Social.
            – Pacto Social?  Como o do nosso colega que já regressou à Terra? – Perguntou Durkheim, referindo-se a John Locke.
            – Não, bem, mais ou menos. Na verdade, começamos a desenvolver essa teoria juntos, mas como é de praxe discordamos já no começo – ambos riram ao lembrar de Locke – somos distintos ao ver o Estado de Natureza e a propriedade privada. Resumindo, é notório que, por favor que os gregos clássicos não me ouçam – riram –, mas a democracia de fato é impraticável. O Pacto Social é “encontrar uma forma de associação que defenda e proteja contra toda força comum, a pessoa e os bens de cada associado e pela qual cada um, unindo-se a todos, apenas obedeça a si próprio, e se conserve tão livre quanto antes”1.
               – Bom, bela teoria, o que te trazes, porém, aqui?
            – Algo está vacante, não queria abstrair-me, vejo, todavia, que o Pacto Social não pode ser geral. Afinal, hão de existir pessoas que não concordarão com o Pacto, e não abrirão mão de suas liberdades individuais.
            – Caro amigo, não queria adiantar-me; devo, entretanto, mostrar-te o que venho estudando: o Fato Social. Além da semelhança fonética nos títulos de nossa teoria, uma pode justificar a outra – Durkheim deixa de lado seu cachimbo, limpa seu dedo indicador direito e olha nos olhos de Rousseau que se encontra pronto para anotar o que for preciso – acompanhe-me, pois, no que vou dizer-te. O Fato Social, é o exterior, existe, logo, anteriormente às pessoas; é geral, porquanto abrange um determinado coletivo; por fim, quem não se adequa ao fenômeno social é coagido, podendo ou não gerar a anomia individual. O Estado, pois, é um fato social, note que é geral, exterior e coercitivo...
                 – Genial! – Interrompe Rousseau embasbacado, e sem conseguir mover um dedo sequer.
            – Foi o que Comte disse-me semana passada, o coitado saiu daqui acreditando que tudo viraria ciência... – puseram-se ambos a gargalhar –, finda essa breve digressão, concluo: o Estado, ao meu ver é um fato social que muito dificilmente se dissolverá; os indivíduos creem cegamente em sua necessidade.

·         REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1 ROUSSEAU, Jean Jacques, “O Contrato Social” – 1973 p. 32.


Pedro Cabrini Marangoni – 1º ano Direito noturno

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