terça-feira, 22 de novembro de 2016

Judicialização Dicotômica

Imagine você morando um ano com seu namorado. Vivendo como “praticamente casados”. Parceiros de vida. Um belo dia ele te pede em casamento. Procedimento simples: marcar o casamento no cartório, assinar os papéis e “voilà”: estão casados perante a lei. Agora imagine outro cenário: você, morando com sua namorada. Por oito anos já. Vivendo como “praticamente casadas”. Parceiras de vida. Um belo dia ela te pede em casamento... Percebe? Não existe procedimento simples. Até 2011 não era aceita a união entre pessoas do mesmo sexo perante a lei. A união estável entre homossexuais não era aceita e o casamento civil inimaginável.
A decisão do SFT acerca da união homoafetiva foi de extrema importância no sentido de que foi capaz de garantir a esses cidadãos brasileiros seus direitos fundamentais. Direitos que estão presentes na Constituição Federal nos arts. 3º, inciso IV e caput do art.5º. Ainda que existam leis do ordenamento que dizem o contrário: o art. 1723 do Código civil alega que é “reconhecida como entidade familiar a união estável entre homem e mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura estabelecida com o objetivo de constituição de família”, este artigo, deve ser interpretado conforme a CF. Nossa “lei maior”. Materialmente e formalmente superior às demais leis. Se uma lei do CC impede a garantia daqueles direitos fundamentais previstos nos artigos da CF, como os supracitados, há de haver uma interpretação minuciosa do judiciário para garantir a efetivação desses direitos fundamentais.
Após essa decisão do STF, porém, gerou-se uma ampla discussão acerca da judicialização, conceito apontado por Luís Roberto Barroso. A judicialização para Barroso seria a tomada de decisões de cunho político e de interferência social pelo Judiciário que originalmente eram decididas e discutidas pelo poder Legislativo e Executivo. Muito se questiona sobre se o judiciário está ferindo a separação dos três poderes, ao entrar no território de decisão dos outros dois poderes mencionados.
Ora isso parece um pensamento de certa forma supérfluo. Sigamos aos fatos: os cargos dos poderes legislativo e executivo são “conquistados” através de eleições, voto popular. E, como sabemos, existe reeleição. Assim sendo, esses políticos, ao tomar decisões, visam, primordialmente, sua reeleição que será garantida mediante a tomada de decisões “corretas”, ou seja, que não firam a opinião e as expectativas de seu eleitorado. Desta forma, fica fácil entender por que o legislativo, por exemplo, ao elaborar leis costuma se esquivar de leis que envolvam “assuntos polêmicos” de grande dicotomia popular: eles não querem posicionar-se para não perderem eleitores e garantirem sua reeleição.
Pois bem, avalie-se o cenário citado: uma lacuna legislativa, a falta de leis que discorram sobre assuntos dicotômicos. Esses problemas referentes à “assuntos dicotômicos” aparecem, porém, para serem resolvidos pelo judiciário. Este, todavia, não vê respaldo 100% legal e 100% previsto na legislação para solucionar esse problema, oriundo da lacuna legislativa. O judiciário só vê uma opção nesse caso: fazer o que o art. 4º da lei de introdução ao direito brasileiro prevê que é que “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Portanto, como judiciário deve ter uma resposta para esse problema, tendo que solucionar o caso, ele tomará sua decisão sendo isso previsto especificamente ou não em lei.

No que se refere à união homoafetiva o artigo que previa especificamente a união entre casais era omissa quanto à união entre pessoas de mesmo sexo, o que feria outros artigos materialmente superiores que proíbem preconceitos relacionados a sexo além de assegurar que “todos são iguais perante a lei”. O que o judiciário fez, portanto, foi utilizar esses preceitos superiores e absolutos no preenchimento dessa lacuna legislativa. O que em nenhum momento deve ser comparado a ativismo judicial. Este conceito que alega que o judiciário utilizando seus instrumentos de controle de constitucionalidade acabam interferindo indiscriminadamente nos demais poderes. O que o judiciário faz é, puramente, através de leis preexistente e considerando as demandas sociais elaborar decisões que garantam a efetivação de direitos fundamentais.


Heloísa Guerra Rodrigues da Silva - 1º ano - Matutino

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