segunda-feira, 3 de outubro de 2016

A letra fria da lei é justa?

O caso que ficou conhecido como “massacre do Pinheirinho” foi um acontecimento que demonstrou todas as peculiaridades do direito brasileiro. Ao analisar o fato, é possível observar as inúmeras irregularidades que ocorrem tanto no direito propriamente dito como na maneira em que ele é interpretado e aplicado.

Fala-se em “massacre do Pinheiro”, pois o que ocorreu naquele lugar foi uma verdadeira situação de guerra. Situação essa criada pelo Poder Judiciário e pelo Estado, que trataram aquelas pessoas como inimigos da sociedade. Massacre porque em prol de um direito (propriedade) foram suprimidos vários direitos de uma vida digna. Até que ponto o direito de posse ultrapassa o da dignidade?
Nesse contexto, faz-se necessário analisar a questão de hierarquia que as normas mantêm entre si. De fato, o direito de propriedade se encontra equivalente ao direito à moradia. No entanto, é válido lembrar também que juntamente com o direito a propriedade existe um elemento que muitas vezes é ignorado. Trata-se da função social que a propriedade deve ter. E, no caso Pinheirinho, ficou mais do que provado que a área pertencente à empresa Selecta S/A estava abandonada há anos, além de não cumprir sua função social.

Ademais, o que se deve ressaltar é que, apesar da empresa supracitada ter o direito à propriedade, direito, aliás, previsto constitucionalmente, e que, de fato, a ocupação dos moradores se constitui uma invasão, o que estava em jogo era um rol de direitos considerados fundamentais, direitos que muitas vezes, estão presentes em discursos românticos do ordenamento jurídico. Esses “direitos fundamentais” se compilam no que se chama “dignidade da pessoa humana”. Naquele momento, tratava-se de várias "dignidades" que estavam submetidas ao direito de propriedade.

Nesse sentido, a própria questão de proporcionalidade do direito foi violada. É proporcional a salvaguarda de um direito à propriedade em detrimento de vários direitos a dignidade? Não seria mais razoável solucionar a questão ponderando os dois lados? O próprio direito evidencia: é preciso saber aplicá-lo. Não basta a norma escrita para promover a justiça, pois se faz necessário o deslocamento dessa norma ao caso concreto.


Portanto, o direito não se trata somente de um meio pelo qual se garante a liberdade, como dizia Hegel, é preciso analisar se essa liberdade criada está compatível com princípios éticos e morais e, portanto, legítimos. O caso Pinheirinho se aproximou mais ao pensamento de Marx, que compreendia o direito como importante instrumento de dominação político-social, pois para muitos juristas e Magistrados envolvidos no caso, o direito foi aplicado. No entanto, nota-se um direito que resultou no suprimento de "diversas dignidades", que resultou nos piores golpes aos Direitos Humanos, ferindo gravemente o Estado de Direito Social. 

Murilo Ribeiro da Silva   1ºano de Direito, matutino.

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