sábado, 3 de setembro de 2016

A parte pelo todo

‘’O destino de uma época cultural que ‘provou da árvore do conhecimento’ é ter de saber que podemos falar a respeito do sentido do devir do mundo, não a partir do resultado de uma investigação, por mais perfeita e acabada que seja, mas a partir de nós próprios que temos de ser capazes de criar este sentido’’ Max Weber

Na concepção de Max Weber o objetivo de uma ciência empírica jamais pode ser elaborar normas e ideais obrigatórios a fim de conceber ‘’receitas’’ para a prática. Assim, cabe a ciência social evidenciar ao sujeito que uma determinada ação ou não ação implica na tomada de posição em favor de determinados valores, porém, a ponderação e a escolha axiológicas pertencem ao indivíduo. Isso não significa que a análise weberiana defenda - como Durkheim defende- a neutralidade total do cientista social, pois a própria escolha de um fenômeno em detrimento de outro já é subjetivo. Na verdade, a preocupação e repulsa de Weber é que a ciência esteja à mercê de posições político- partidárias. Destarte, diante da impossibilidade da imparcialidade total é necessário que haja uma separação e diferenciação entre elucidação cientifica e reflexão valorativa, ou seja, é fundamental que o cientista indique e delimite o que consiste na sua fala enquanto pesquisador e em qual momento entra a sua análise enquanto cidadão dotado preferências ideológicas.
Desse panorama inicial, percebe-se que- ao contrário, novamente, da visão durkheimiana- em Weber o todo não se sobrepõe as partes e tampouco as ações dos indivíduos são coordenadas pela força da sociedade. Na sociologia weberiana o homem é o elemento ativo que determina a permanência ou não de valores e condutas, são essas ‘’ações sociais’’ que movimentam a sociedade e, por consequência, a história. Sendo a ação social o motor das continuidades e mudanças é ela o objeto de estudo do sociólogo. Weber visando delimitar ainda mais esse objeto e estabelecer um método universal divide tais ações em quatro tipos: a ação social com relação a um objetivo, na qual o sujeito estabelece meios compatíveis com os fins que ele pretende atingir, além da ação social com relação ao valor, a emocional e a tradicional. É evidente que os tipos de ações se interpenetram na prática, no entanto, o sociólogo deve observar qual delas se destaca, isto é, essas categorias de ação social são ‘’tipos ideais’’. Sérgio Buarque de Holanda, por exemplo, se utiliza do tipo ideal em ‘’Raízes do Brasil’’ quando afirma que o brasileiro age muito pelo emocional. Ao constatar isso, o historiador não está se referindo aquele ou a este brasileiro, mas sim a uma característica geral que se destaca dentre os indivíduos e possui, portanto, maior relevância para o estudo científico do fenômeno.
Partindo do enfoque na ação individual e dada a complexidade e a variedade de ações sociais, Weber nega a perspectiva positivista de evolução da história da humanidade rumo ao progresso. A sociedade não tem um caminho pré-estabelecido, ela consiste em um conjunto inesgotável de acontecimentos que aparecem e desaparecem graças a ‘’ação social’’, assim, as explicações dos fenômenos sociais derivam de múltiplas causas e não só do grau de desenvolvimento da ciência como afirmaria Comte e nem do modo de produção, em uma análise marxista. Por isso, Weber afirma em sua crítica ao marxismo que a explicação dos fatos pode estar relacionada à economia, mas pode também estar ligada a fatores religiosos, políticos ou culturais. Fala-se, dessa forma, que há um determinismo econômico na análise de Marx e Engels. No entanto, é importante salientar que apesar de infraestrutura ser a geradora da superestrutura, a relação entre elas não é unilateral, mas sim uma via de mão dupla. Isto é, a economia não se sustenta sozinha e o marxismo considera a influencia da religião, da ideologia e da cultura no geral como sustentação do sistema socioeconômico e como explicação para os fenômenos sociais. 
Por fim, cabe evidenciar sucintamente a atualidade do pensamento weberiano. Weber nega, como visto, a perspectiva utópica da neutralidade da ciência. Nesse sentido, podemos destacar a inconsistência dos argumentos favoráveis ao ‘’Escola sem partido’’, uma vez que os conhecimentos vinculados ao projeto político-pedagógico escolar já possuem e sempre possuirão orientação ideológica. A perspectiva histórica e literária eurocêntrica, por exemplo, é ideologia. Ademais, Weber adota uma análise sociológica que privilegia a ação individual. Dessa forma, o seu pensamento dialoga com a atual tendência de valorização das ações individuais, as quais são vistas como capazes de provocar grandes mudanças sócio-politicas, a própria ideia de meritocracia e do ‘’self made man’’ são outros exemplos contemporâneos de primazia individual e de predominância das partes na orientação das eternas descontinuidades históricas. 

Juliana Inácio- Direito (noturno)

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