domingo, 13 de março de 2016

Vazias Razões


  O aconchegante café do bairro estava lotado, nada incomum para um domingo. Com o jornal em uma mão e o negro expresso em outra, não estava interessado em mais nada ao meu redor. Porém, subitamente, deparei-me com certo incomodo sonoro e então percebi o que estava se passando. A mesa vizinha, que acomodava dois homens, era palco para certa discussão.
  O mais velho deles, com o ar petulante e arrogante de quem se considera detentor da razão, afirmava convictamente certa opinião sobre vida após a morte com perceptivas tendencias ao fanatismo religioso. O segundo, sereno e sem se alterar, discordava das afirmações e argumentos do colega, tentando expor a ele sutilmente seu ponto de vista sobre as falhas justificativas do parceiro.
  Mesmo com os sons advindos de máquinas e de pessoas exageradamente predispostas a falar, consegui captar certos pontos do debate. E o que mais me interessava era como o segundo homem expunha tão discretamente os conceitos cartesianos em seu discurso, sobretudo frisando a real necessidade do questionamento ao deparar-se com uma nova informação.
  Eis que me coloquei a refletir. Cotidianamente nos deparamos com situações as quais, por hábito ou indisposição, aceitamos cegamente sem ao menos nos questionar sua procedência. Tendo em vista a incomensurável chance de certa suposição ser equívoca, há de se ter em mente que para obtenção de conhecimento a dúvida é indispensável. Gradativamente, através de questionamentos e racionalização, atravessa-se a epiderme sobre certo assunto e então encara-se este profundamente, rompendo com o bloqueio oriundo do senso comum. A névoa que circunda as incertezas são dissipadas uma vez que há desconfiança e determinação para alcançar o saber. Quem sabe assim, eu, o senhor do café e cada indivíduo pensante sejamos todos mais lúcidos. Sejamos todos mais cientes e menos alienados. Sejamos todos, nem que por um momento, Descartes.
 

Sophia Re - aluna do 1º ano de Direito diurno.

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