segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

O embate do capital simbólico

                     O campo jurídico apontado por Pierre Bourdieu, como os outros campos, é caracterizado por diversos elementos com conteúdos específicos que modelam e estruturam a esfera jurídica como um campo que emana uma força do direito. Assim, o direito se dá como um campo pois possui um habitus, forma, capital simbólico, linguagem e agentes, específicos para seu funcionamento e (re)construção.
               O campo jurídico tem a capacidade de modificar as relações e organização de entes políticos e sociais por meio de seus agentes, sendo estes os doutrinadores e os operadores do direito, assim, a doutrina se apresenta como elemento do capital simbólico e base importante para a argumentação e tomadas de decisão dos operadores do direito, no entanto, a configuração final através da interpretação e argumentação dada às diversas situações é gerada pelos magistrados. Bourdie define o campo judicial como "o espaço social organizado no qual e pelo qual se opera a transmutação de um conflito directo entre partes directamente interessadas no debate juridicamente regulado entre profissionais que actuam por procuração e que têm de comum o conhecer e o reconhecer da regra do jogo jurídico" (BOURDIEU, 1989, p. 229), ou seja, o campo judicial tem que ser provocado por partes interessadas para assim haver o embate entre profissionais providos do capital simbólico específico do campo e derivada deste embate uma decisão formal.
           Com isso, entramos no âmbito da ADPF 54 que é o embate formal que decidiu inconstitucional que a interpretação da interrupção de gravidez de feto anecéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126, e 128, incisos I e II, do Código Penal. Tal interpretação se deu pois o consenso foi que a interrupção da gravidez não iria ferir preceitos e princípios da constituição porque no caso de anecefalia não há a possibilidade de vida, com isso, os efeitos e traumas de todo o processo de gestação voltaria apenas contra a mulher, como aponta Nelson Hungria: " Não está em jogo a vida de outro ser, não podendo o produto da concepção atingir normalmente vida própria, de modo que as conseqüências dos atos praticados se resolvem unicamente contra a mulher". Com efeito, não apenas não há vida e os efeitos voltam-se contra a mulher grávida, inexiste meio de viabilizar ou na sanar a vida do feto. Assim, decidiu-se inscontitucionais os artigos 124, 126, 128, incisos I e II, do Código Penal,  interpretados a ponto de alcançar tal antecipação terapêutica. Logo, através de reflexão e utilização do capital simbólico em meio à uma forma determinada e o habitus jurídico foi tomada uma decisão que influi e foi influênciada diretamente por outros campos como o social, no primeiro caso, e o da medicina, no segundo.
                    

Nenhum comentário:

Postar um comentário