domingo, 22 de novembro de 2015

Saturação Judicial

Jesus-Maria Sánchez irá emprestar a ideia de Beck de sociedade do risco para caracterizar a nossa atual sociedade. Segundo este autor, nós vivemos em uma sociedade que preza por um avanço técnico em velocidade alucinante e que esse fato, dentre outros (como a própria globalização e a mundialização do mercado), irão contribuir para fazer do âmbito social um lugar instável e que provoca medos e insegurança a todos os indivíduos. Por sua vez, esse medo e insegurança irão forçar a população a busca amparo e um pouco de segurança em algum mecanismo institucional; segundo Jesus-Maria, esse mecanismo será o Direito Penal, que se expandirá para comportar tudo aquilo que a modernidade o propõe.
Esse fato da expansão do direito Penal está intimamente ligado ao fato de que, atualmente, se têm de maneira geral uma hipertrofia do poder judiciário que irá suprir as demandas sociais através de seus julgamentos. O autor francês Antoine Garapon irá, através de uma metáfora, caracterizar de forma acurada o tema da Judicialização: “o judiciário tem sido o muro das lamentações do mundo moderno”. Ou seja, frente a uma sociedade sem bases estáveis, com uma moral volátil e sem garantias estatais, o judiciário se vê encarregado de fornecer tal segurança e garantia.
Colocado mais formalmente a Judicialização significa que algumas questões de larga repercussão política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo. Como é discutido por Barroso em seu artigo “Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática”, esse empoderamento do judiciário, no caso brasileiro, é fruto de diversos fatores, mas pode-se apontar três com maior clareza: 1) após a redemocratização e com a promulgação da constituição de 1988, “com a recuperação das garantias da magistratura, o Judiciário deixou de ser um departamento técnico-especializado e se transformou em um verdadeiro poder político, capaz de fazer valer a Constituição e as leis, mesmo em confronto com outros poderes” (p.3). Aqui é capaz de se enxergar o problema do STF ter sido eleito como o guardião da constituição; com essa posição ele acaba se vendo na possibilidade de vetar os outros poderes sobre o pretexto de violação constitucional, porém, quem guarda o guardião? 2) A nossa constituição tem um dos sistemas de controle de constitucionalidade dos mais abrangentes e difusos do mundo. Ele possibilita a juízes de qualquer instância deixar de aplica uma lei caso a considere inconstitucional. 3) Uma constitucionalização abrangente, quase todos os assuntos possíveis se encontram constitucionalizados. Constitucionalizar uma matéria significa transformar política em direito, espera-se que isso passe a fazer parte do enredamento normativo, é algo pelo qual se espera efetividade, não é mais discussão. Está na norma, essa norma tem que ser efetiva.
Tudo isso para apontar que o Brasil passa por uma tremenda crise de representatividade e política. Sendo assim, os movimentos sociais tradicionais como os sindicatos e os partidos políticos perdem espaço e importância em um cenário que a efetividade dos poderes em que atuam (Legislativo e Executivo) é muito pequena. Como foi colocado acima, a população opta por legitimar o poder que está baseado na efetividade, que é o judiciário. É simples se perceber que é ele quem dá efetividade a norma, e uma vez posto na norma, uma vez que o direito tenha sido oficializado, ele deve ser efetivado. Caso não seja, o poder judiciário está aí para enforçar sua eficácia.
Contudo, isso leva a outra faceta do problema de representatividade uma vez que este poder não tem seus membros eleitos de forma a reduzir a exerção da cidadania e isso é uma ameaça a Democracia. O voto parece que perdeu sua importância, importante é entrar com ADPMs, ADINs etc. pois na visão atual, só elas podem garantir direitos. Por sua vez, isso irá levar a um inevitável problema fiscal já que os juízes não foram treinados e não tem o devido conhecimento em matéria de gestão de políticas públicas: se obriga o governo a colocar em prática políticas públicas (as quais ele teoricamente já se havia comprometido) porém não se tem o embasamento econômico para tal disposição.
Todavia, a expansão do judiciário e o ativismo judicial nem sempre são prejudiciais. Como em contraponto à reação conservadora do congresso o STF aprova medidas em sua maioria a favor justamente das minorias e das demandas sociais, com é a decisão da ADI com relação à união homo afetiva, na qual ficou decidido que sim, homossexuais poderiam desfrutar de uma união estável.
Vivemos em épocas sombrias, na qual o chão parece instável: não se têm mais uma moral bem definida, os movimentos de representatividade como os partidos políticos já não conseguem mais dar voz aos ensejos populares, as garantias de antigamente parecem ter evaporado e os comandantes do país optam por uma marcha rápida a um conservadorismo limitador e discriminador. Nesse contexto somado a desconfiança do legislativo posta na constituição de 1988, tem-se uma expansão do Poder Judiciário, que acaba por se constituir como ele próprio como garantidor das demandas das minorias e de certa estabilidade para uma população perdida em meio ao caos do mundo globalizado e tecnicista.

Bibliografia:
BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática.

SÁNCHEZ, Jesús-Maria Silva. A expansão do Direito Penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós-industriais. Revista dos tribunais: 2002.


Tiago de Oliveira Macedo/ 1ºano Direito Diurno

Nenhum comentário:

Postar um comentário