sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Quando as diferenças são respeitadas

Temos o direito de ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito de ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza.  Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades”


A citação acima foi feita por Boaventura de Sousa Santos, em sua obra Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Neste contexto, inserem-se as cotas raciais, e as ações afirmativas como um todo, que ao tratar indivíduos desiguais de maneira desigual, portanto, por meio da discriminação positiva, visam atingir a igualdade material e efetiva.
Os negros estão inseridos nos dois processos de exclusão propostos por Boaventura: no pré-contratualista e no pós-contratualista, visto que devido a instabilidade e o fascismo social imperante na sociedade, aqueles que alguma vez chegaram a fazer parte do contrato social não o fizeram de maneira permanente, e outros que historicamente estão totalmente a margem e excluídos do contrato social mais básico.
Diferentemente da forma que colocada pela concepção neoliberal em que a sociedade esta inserida, as cotas raciais, étnicas e sociais não tratam de uma questão de capacidade ou de mérito, mas sim da questão de igualdade de oportunidades. Além disso, em oposição ao que defende o Partido Democratas na ADPF que pleiteia a inconstitucionalidade das cotas na faculdade da UNB, a exclusão e a injustiça para com os negros não ocorre somente por motivos sócias e econômicos, mas principalmente por causas raciais, ou seja, é essencialmente devido ao seu fenótipo que os afrodescendentes sofrem discriminação e não tendo nenhuma ralação com seu genótipo. Desta maneira, por exemplo, quando uma pessoa de cor negra de classe baixa está à procura de um trabalho, esta sofre uma discriminação dupla, primeiro pelo fator econômico e em segundo, pelo fator racial, ao passo que este último é determinante.
Portanto, a questão das cotas, apesar de serem neoliberais, evidenciam o cosmopolitismo ao passo em que propõem outra capacidade de conhecimento que não aquelas lineares, como a meritocracia. Além disso, na sociedade em que vivemos hoje, com a flexibilização do trabalho, que é uma das contribuições para manutenção dos negros na sociedade civil estranha e na incivil, bem como o neoliberalismo e a hegemonia da ciência, por meio das inovações, tornam a inserção dos indivíduos nas universidades por meio das cotas a forma mais rápida e eficaz destes conseguirem alguma mobilidade social.
Ademais, as cotas são uma forma de reduzir as diferenças de oportunidades e possibilitar que a composição multirracial da sociedade brasileira esteja representada em todos os níveis e esferas do poder. Nesse ínterim, elas afrontam o fascismo social produzido pela sociedade excludente e desigual que visa somente a realização de seus interesses individuais e é legitimada pela globalização hegemônica neoliberal, ao passo que o liberalismo está assentado justamente no “aumento dramático da desigualdade nas relações sociais”.
Desta maneira, “as diferenças, por carregarem consigo visões alternativas de emancipação social, devam ser respeitadas”, o que se realiza através das cotas conquistadas. Em relação a pergunta feita por Boaventura no titulo da sua obra, Poderá o Direito ser emancipatório? As cotas exemplificam que, ao ser utilizado de modo a promover a inclusão de minorias através de lutas, movimentos e organizações, o Direito pode de fato servir de instrumento de mudança contra hegemônico para a emancipação social, mesmo que a longo prazo.
Mariana Miler Carneiro
1°ano - Noturno

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