domingo, 8 de novembro de 2015

Ainda há tempo.



Há alguns anos, foi aberto um processo pelo Partido Democratas, questionando a criação de reserva de vagas – as “cotas” raciais – pela UnB na universidade. O Partido considerava inconstitucional a medida, porque, supostamente, entraria em conflito, por exemplo, com o princípio da igualdade. Que igualdade essa, entretanto, que faz com que o acesso à universidade publica só seja possível a uma minoria com boas condições socioeconômicas?
O ministro Lewandowski, com o apoio de outros, considerou a criação das cotas como constitucional, sendo que tornaria possível o ingresso de negros, muitos dos quais possuem péssimas condições de vida e de educação, às universidades.  O que, sem dúvidas, seria positivo.
Séculos se passaram desde o fim da escravidão no Brasil. Mas desde a Lei Áurea – que apesar do nome, não foi tão “magnífica” como deveria – não foi observado, no país, nenhuma política de reintegração dos “beneficiados” pela Lei. Embora hoje navios negreiros não cruzem o oceano, o capital continua escravizando e tornando a vida da população negra muito difícil.
Através do pensamento de Boaventura de Sousa Santos, que considera válidas as intervenções do Estado na sociedade, desde que para garantir melhorias, como ampliação de direitos, é possível entender a necessidade e o caráter primordial da criação de ações afirmativas tais como tais cotas. Através de medidas constitucionais, é dever do Estado garantir uma igualdade real, não apenas formal. Pode-se observar tais ideias explicitamente no trecho de seu artigo “Justiça social e justiça histórica”:
Em primeiro lugar, o sistema de educação superior pode recusar-se a reproduzir as desigualdades que lhe são externas e mobilizar a comunidade para a construção de alternativas de inclusão de segmentos historicamente alijados das universidades em razão da cor da pele ou identidade étnica. Em segundo lugar, a construção e adopção de alternativas com este recorte não acarreta prejuízo para a qualidade dos trabalhos acadêmicos; ao contrário, traz mais diversidade, criatividade e dinamismo ao campus.
É, realmente, muito difícil definir a cor de pele da população brasileira. É quase impossível encontrar pessoas, mesmo que consideradas brancas, que não possuam ancestrais negros, indígenas, ou de qualquer outra etnia. Mas também não é questionável a grande porcentagem de negros, pardos e indígenas que vivem na pobreza, que não possuem plenas condições de estudo e de ingresso à universidade. Os números não são mera coincidência.
A constitucionalidade da criação das cotas pela UnB demonstra como, ao olhar de Boaventura, o Direito pode ser não aquilo que estabelece o status quo e que mantem uma hierarquia de classes, mas, sim, instrumento que configura o processo de emancipação social. Embora  sejam necessárias medidas fulcrais a longo prazo, como o investimento na educação fundamental pública de qualidade, ações a curto prazo que possam mostrar resultados são sempre bem vindas.


Alexandre Bastos
1º ano - Direito Diurno
Sociologia do Direito


Nenhum comentário:

Postar um comentário