quinta-feira, 15 de outubro de 2015

A dialética das racionalidades em Weber

“Porque una es más auténtica cuanto más se parece a lo que ha soñado de si misma!” - Agrado, personagem transgênera do filme Tudo Sobre Minha Mãe (Pedro Almodóvar, 1999)

Uma tutela tratando sobre transgenitalização foi deferida por um magistrado da cidade de Jales (SP). Segundo sua decisão, o Estado deveria oferecer a cirurgia, bem como a mudança do nome e de todos os documentos da parte transgênera. Uma conclusão que aplica e amplia direitos constitucionais (liberdade, igualdade, privacidade, intimidade) e princípios (dignidade da pessoa humana), desarticulando conservadorismos que, por vezes, mostram-se calcados na sociedade brasileira, gerando preconceito e prejudicando a busca de direitos das minorias.
Nesse sentido, segundo um estudo sobre saúde mental feito pela “Transgender Equality Network” em favor da comunidade transgênera da Irlanda, 78% de “transgêneros” pensaram em se suicidar e 44% tentaram-no pelo menos uma vez. Esses dados, segundo a fonte¹, com certeza se estendem para outros locais do globo, e o Brasil não fica de fora. Na tutela analisada, psicólogos e psiquiatras já haviam comprovado, após vários anos de terapia da parte, que a mesma sofria constantemente com o não pertencimento ao seu corpo, lidava com preconceitos, além do estresse e quadro depressivo que poderia levá-la ao suicídio. Portanto, baseado plenamente em direitos constitucionais, no Código Civil e no princípio da proporcionalidade do direito, o juiz deferiu a tutela antecipada.
Ora, tal caso pode ser analisado à luz de Weber, por seus conceitos de racionalidade formal e material. O magistrado, ao decidir conforme o direito posto, obedece a racionalidade formal: para Weber, tudo aquilo que pode ser calculado, tem causa e efeitos previstos. Entretanto, não se pode negar a existência concomitante, e é aí o ponto chave da teoria Weberiana, da racionalidade material, pois, para o autor, nada é puramente formal. Na verdade, o ideal seria que lacunas no direito não existissem; o direito deveria ser para todos, mas isso não ocorre, principalmente em uma sociedade capitalista e cada vez mais especificista, que segrega o não padronizado. Ou seja, as minorias ficam à margem da sociedade, e o legislativo, não abarca seus anseios, estando focado na concretização de uma racionalidade formal baseada nos valores de quem o compõe, com o pretexto de serem decisões e legislações “gerais”, quando na verdade não o são.
Porém, esta jurisprudência analisada é essencial como gatilho para a modificação dessa situação. O julgamento ético, por valores ou costumes, apresenta-se em qualquer tipo de decisão, os indivíduos não conseguem escapar deles. Sendo assim, os valores da parte transgênera foram, nesse caso, amplamente considerados, a medida que tornou-se uma provocação para a aplicação da racionalidade formal.
No caso, o juiz manteve-se como o aplicador da lei, cumprindo o seu papel de expandir os preceitos constitucionais, por analogia, já que, o legislador não poderia prever todas as situações que seriam apresentadas no campo jurídico. Utilizou-se do implícito dentro do explícito, aperfeiçoando uma hermenêutica necessária para a realidade social vigente.

¹ http://ipco.org.br/ipco/noticias/78-de-transgeneros-pensaram-em-se-suicidar#.UzVjw6zYMuQ


Ana Flávia Toller - 1º Ano Direito Diurno - Aula 1.2 - Weber - Sociologia do Direito

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