domingo, 27 de setembro de 2015

Por um Direito achado nas ruas

Cabe ao estudante e ao profissional do Direito se questionar: o papel dos juristas é seguir normas ou fazer justiça? O que é justiça? A quem serve o Direito?

São questões como essa que ocupam minha cabeça enquanto estudante de Direito, mas será que é assim com todos? A juíza Márcia Faria Mathey Loureiro, do caso Pinheirinho, responsável pela medida de reintegração de posse, afirmou que apenas agiu conforme a lei e que não cabia a ela enquanto membra do Judiciário tomar uma atitude que não a reintegração. Afirma também que o Direito de Propriedade e o Direito à Moradia não se sobrepõem, mas, então, por que a propriedade privada sempre é mais salvaguardada e garantida pelo Estado?

Na obra “Para a Crítica da Filosofia de Hegel” e em todos seus escritos, Karl Marx discorre sobre o Estado, a religião, a propriedade privada, a luta de classes. De que formas podemos relacionar esses conceitos com o caso Pinheirinho? Bom, fica claro que quando há a construção de moradia populares e a transferência da população de baixa renda para locais distantes, temos a luta de classe. Quando o direito de pessoas pobres é subjugado em favor de grandes proprietários, temos a luta de classes. Quando a mídia não se comove com 1600 famílias sendo expulsas, agredidas, violentadas pelo Estado, mas sim com uma perda material de uma empresa falida, temos a luta de classes. Contemporaneamente, podemos dizer: um espectro ronda o Brasil – o espectro da luta de classes. Vejo-a na luta por moradia, na luta por lazer, na luta pelo direito de ir e vir, no trabalho doméstico, nos shoppings, nos teatros, na faculdade, na sala de aula, na magistratura.

Apesar de esse ser o aspecto mais gritante do caso, devemos dar enfoque também no Direito e suas contradições. Seria radical dizer, com o exemplo do Massacre do Pinheirinho, que o Direito, por si só, serve à burguesia e à manutenção do Estado capitalista? Afinal, apesar de a juíza afirmar que o Direito à Moradia e o Direito de Propriedade encontram-se no mesmo nível de hierarquia, o Direito de Propriedade prevaleceu. É radical afirmar que, mais que desprezados pelos operadores do Direito, os Direitos Humanos, o Direito à Moradia, à Vida, à Família, à Felicidade e à Dignidade não encontram uma dificuldade já no “papel”, quando esbarram no Direito de Propriedade? Isto é, os Direitos Sociais são incompatíveis com o Direito de Propriedade, pois esta, por si só, expulsa, agride e violenta os mais pobres.

Mais que a prova de uma verdadeira posse daquela terra por parte dos moradores, os operadores do Direito deveriam requerer à falida empresa Selecta se a função social daquele espaço estava sendo garantida, se a vida e a moradia daquelas famílias não estavam sendo prejudicadas em prol da especulação e do capital financeiro.

Finalizo deixando uma reflexão: nós, estudantes de Direito, queremos ser profissionais que seguem os Códigos elaborados pelos homens brancos com alto valor aquisitivo ou queremos caminhar com um novo Direito? Um Direito achado nas ruas, um Direitos dos desprivilegiados, um Direito para as mulheres, para os negros, para a periferia. Queremos alimentar o sistema que sempre ignorou essas classes ou queremos construir com elas e para elas um Direito capaz de contemplar a todos igualmente? O Massacre do Pinheirinho serviu para nos ensinar que apesar do sistema não facilitar o acesso à justiça, nós, como advogados(as), promotores(as), defensores(as), juízes(as) e desembargadores(as) podemos fazer nossa parte quanto a casos que dependem de nossa decisão.



Gabriela Alves Fontenelle - 1° ano - Direito (noturno)


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