domingo, 27 de setembro de 2015

A Justiça não é cega

2012. Estado de São Paulo. São José dos Campos. 1,3 milhão de metros quadrados. Dois interessados. Naji Nahas, megaespeculador libanês; e 1600 famílias reivindicando sua moradia.

O caso do Pinheirinho ganhou repercussão nacional graças a extrema violência e brutalidade que utilizaram para expulsar cerca de 1600 famílias da região onde moravam. Acontece que a região conhecida por Pinheirinho fazia parte da massa falida da Selecta, empresa pertencente a Naji Nahas. Assim, no ano de 2004 quando o terreno ocioso começou a ser ocupado por famílias sem-teto, Naji Nahas entrou com uma ação de reintegração de posse.

8 anos se passaram desde o início da ocupação e o terreno se transformou em um bairro bem organizado de famílias humildes, que lutavam para ter a posse da área onde fizeram sua moradia. A justiça, porém, decidiu em favor de Naji Nahas, e a juíza Márcia Faria Mathey Loureiro determinou a reintegração de posse. Depois de diversas reviravoltas, a PM e a Guarda Civil chegaram de surpresa no dia 22 de janeiro e expulsaram as milhares de famílias.

A juíza Márcia Faria Mathey Loureiro deixa bem claro em sua decisão sobre o caso que “Não há que se argumentar que a responsabilidade pelo desabrigo dos ocupantes da área pertencente à Massa Falida e objeto desta ação, seja do Judiciário e especialmente deste juízo, como quer fazer crer o requerido. Ao magistrado cumpre analisar a questão posta em juízo e o pedido de restabelecimento de direitos violados à luz da lei e dos princípios constitucionais processuais.”, ou seja, basicamente tira qualquer responsabilidade social que a decisão do judiciário possa ter, alegando que à ele cabe somente fazer valer aquilo que está em lei. Diante disso, cabe discutir-se as concepções do Direito de acordo com os autores Hegel e Marx.

Para Hegel, o Direito expressa o espírito e a vontade de um povo, é a razão pois expõe uma vontade geral, é a liberdade universal. A propriedade para Hegel claramente se sobressairia em relação a moradia, assim como na decisão da juíza Márcia Faria. Já Marx crítica essa visão de Hegel e enxerga o Direito como meio para dominação político-social, que agiria em favor do Estado burguês submetendo uma classe à outra.

A visão de Marx acerca do Direito se encaixa muito bem no que é visto hoje na aplicação do Direito. Assim como no caso do Pinheirinho, o Direito age em favor do Estado burguês e se mostra praticamente nulo no que tange o atendimento as classes mais baixas da sociedade. Esse fato é explícito na decisão da juíza Márcia Faria ao colocar o direito a propriedade como mais valoroso do que o direito a moradia. A juíza alega que o proprietário (mesmo sendo a área do Pinheiro parte de Massa Falida e objeto de desapropriação) tem direito de usufruir da posse do seu imóvel. Mas e quanto ao direito de milhares de famílias de ter uma vida digna e lugar para morar? E o direito de serem tratados com dignidade e não serem expulsos de suas casas as pressas como se fossem lixo? Onde fica o direito dessas famílias frente ao Direito brasileiro?

Não houve nenhum amparo para as famílias que foram expulsas de suas casas no Pinheirinho. Sem nem tempo de se organizarem, perderam tudo do dia para a noite. O direito à moradia foi esmagado pela justiça brasileira, que serve de instrumento para submeter as classes mais baixas as vontades dos grandes, subvertendo os direitos e a dignidade humana. O caso do Pinheirinho manchou mais uma vez a história do Direito brasileiro, e só prova que a nossa justiça não é cega, ela enxerga o lado daqueles que podem pagar para serem vistos.


1º ano - Direito Noturno
Caroline Setti

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