segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Tentativa de mudança à sociedade civil incivil


          Frente à polêmica que engloba a temática das políticas afirmativas, sobretudo no que tange à questão das cotas, argumentos diversos são usados – tanto para corroborá-la quanto para refutá-la. O dualismo composto entre a alegação de que há tentativa de superação das desigualdades históricas e que há racismo institucionalizado compõe esta problemática.
          Ao longo do exposto nos acórdãos na ADPF 186, pode-se perceber traços da dialética social que contrapõe regulação e emancipação, conforme acentua Boaventura de Sousa Santos. A primeira, que há algum tempo  se denotava no interesse burguês de manter a classe trabalhadora excluída, por exemplo, nesse caso é marcada pelo interesse de declarar inconstitucionalidade às cotas justamente como tentativa de manter a população negra excluída de uma oportunidade mais ampla de ingresso à universidade baseando-se em um discurso meritocrata.
          É interessante ressaltar que, na perspectiva de Boaventura de Sousa Santos, a política de cotas só se aplicaria para aquele grupo de pessoas que possui o mínimo de inclusão no contrato social. Assumindo, por exemplo, a visão da dinâmica do pós-contratualismo como processo de exclusão, observa-se que estes próprios grupos se vêem excluídos do contrato social, sem qualquer perspectiva de serem nele inseridos.
          Ainda sob a ótica dos estudos de Boaventura de Sousa Santos, é possível aplicar a este caso uma concepção de apartheid social. Neste panorama, criam-se “zonas civilizadas” – as quais seriam ocupadas majoritariamente por brancos de classe média, possuidores do acesso ao ensino superior sob um critério meritocrata – e “zonas onde floresce a barbárie” – as quais seriam ocupadas por negros que não detêm acesso à educação.

          Desta forma, levando em consideração a decisão tomada pelo STF – na qual a ação que tratava as cotas como inconstitucionais fora julgada como improcedente -, pode-se incutir no Direito um mecanismo de mudança das condições de existência de parcela da população da “sociedade civil incivil” – como é tratado por Boaventura de Sousa Santos o grupo que não compartilha dos mesmos direitos da sociedade civil -, uma vez que estende a tal parcela um rol de direitos – o de alavancar seu acesso ao ensino superior -, fazendo-o adquirir, conseguintemente, uma forma contra-hegemônica, no sentido de se posicionar a favor de lutas políticas emancipatórias no caso tratado.


Caroline Verusca de Paula - 1ºDD

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