domingo, 30 de novembro de 2014

Estado de abstração

           A perspectiva de Hegel sobre o Direito pode ser fundamentada em um ponto principal: o Direito seria uma forma de suprir demandas da evolução do Homem em sociedade, tornando-se assim o pressuposto da felicidade. Segundo Marx, ao acreditar que a razão do homem se desenvolveria por si própria e que a vontade de cada indivíduo coincidiria com ela, Hegel idealiza a universalidade do Direito e poetiza os verdadeiros fundamentos e objetivos do mesmo. Para Marx, o Direito seria somente uma ferramenta de dominação político-social das classes mais fortes e instruídas sobre as mais fracas e menos abastadas, criando uma segregação ainda maior entre elas. A respeito da visão de Marx, pode-se citar o caso Pinheirinho, ocorrido no início de 2012.
         A propriedade - um bairro localizado em São José dos Campos, no estado de São Paulo, supostamente pertencente à uma massa falida da empresa Selecta S/A e abandonado há mais de dez anos - tinha sido ocupada irregularmente desde 2004. Com mais de 9 mil habitantes e uma área superior a 1 milhão de metros quadrados, o bairro do Pinheirinho sofreu uma operação de reintegração de posse determinada pela justiça estadual, utilizando como meios cortes de energia elétrica e água, disparos de armas de fogo e principalmente a força por parte de policiais. Diversos moradores relataram casos de abusos sexuais e de autoridade, além de violência física com espancamentos e tiros de balas de borracha. Fica claro o confronto entre o direito à propriedade, representado pelo empresário titular do terreno, e o direito à moradia, representado pelos moradores que foram expulsos de suas casas de forma violenta e desrespeitosa. É importante lembrar que o terreno se encontrava improdutivo e abandonado por mais de dez anos antes da ocupação dos moradores do Pinheirinho, o que faria com que o direito à moradia sobresaísse como medida mais urgente e notória. Nesse contexto é possível encaixar as opiniões de Marx, que tem o Direito como existente para contemplar a economia capitalista e como consequência, a vontade da classe dominante. Apesar de juristas e entidades políticas e sociais denunciarem o caso à autoridades internacionais e questionarem a violação aos direitos fundamentais humanos, os abusos policiais e a legitimidade das decisões judiciais, nenhum policial ou magistrado foi responsabilizado e os moradores foram desalojados sem nenhuma alternativa de moradia.
          O que se conclui da maneira com que o caso foi julgado é a falta de imparcialidade e a preferência que foi dada ao capital, acima de qualquer direito básico. Disso depreende-se que justo ou não, o Direito é tido como correto e é aceito por todos pelo simples fato de ser lei. A vitória da propriedade privada, dos bens materiais e das classes dominantes sobre os direitos humanos, as reivindicações sociais e a liberdade dos moradores mostra apenas como o Estado moderno de Direito de Hegel é apenas uma abstração, assim como grande parte das garantias positivadas (como o direito à moradia e a função social da propriedade).

Vitória Schincariol Andrade
Turma XXXI - 1º Ano Noturno 

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