sexta-feira, 29 de março de 2024

Pode o funcionalismo explicar a homofobia no Brasil?

O sociólogo Émile Durkheim (1858-1917), considerado como um dos principais fundadores da disciplina sociológica, cunhou o termo “solidariedade mecânica” para designar o movimento que, estabelecido na consciência coletiva de determinado grupo social (apesar de nascer da consciência comum), tenta repelir qualquer ação considerada ofensiva e que possa abalar a manutenção da “paz social” na sociedade. Em uma sociedade capitalista e positivista, essa expressão não atua apenas para inibir o que, de fato, é crime perante o código penal, mas também para coibir direitos e a liberdade individual de grupos minorizados.

Como exemplo de grupo minorizado atacado por essa “solidariedade mecânica”, podemos citar a comunidade LGBTQIAP+ no Brasil que, mesmo após o reconhecimento do casamento homoafetivo em 2011 e a equiparação do crime de homofobia com o de racismo em 2019, segue sendo uma população discriminada e brutalmente morta por pessoas que se autodeclaram “cidadãs de bem”. Um fato recente que comprova essa afirmativa é a proibição da mostra de cinema LGBTQIA+ que aconteceria na cidade de Rio do Sul (SC) pelo prefeito José Thomé (PSD). No pronunciamento feito pelo mandatário em sua conta do Instagram, ele afirma que proibiu o evento que, na visão dele,  “promove a ideologia LGBT”, afirmando ainda que o fez por “respeito aos princípios cristãos e da família”.

Apesar do prefeito ser o porta-voz desse discurso, ele é, na verdade, retomando a concepção de solidariedade mecânica exposta no primeiro parágrafo, uma ideia concentrada na consciência coletiva de uma sociedade cuja “paz social” é sinônimo de preceitos bíblicos e patriarcais, compreendendo qualquer discussão sobre identidade de gênero e orientação sexual como precursora do estabelecimento de um estado de anomia que poderia ruir a ordem social da qual está acostumada. Por isso, apesar de, após a viralização do comunicado, haver vários comentários contrários à censura imposta pelo prefeito, há escritos que comemoram a decisão e parabenizam José Thomé pelo ato.

Além do vídeo do prefeito, há diversas outras falas e ações, tanto públicas quanto privadas, que reforçam a coletividade presente no discurso lgbtfóbico. Esses comentários sempre repetem as mesmas palavras: “defesa da família”, “contra a ideologia de gênero” e “proteção às crianças”, denotando uma articulação comum e que, mesmo com o avanço de pautas da comunidade LGBTQIAP+, está presente e atuante no mais diversos convívios sociais do nosso país.


Daniel Nobre Fernandes da Silva RA: 241221072