sábado, 18 de março de 2023

Crise da imaginação sociológica e a ascensão global da extrema-direita

Na realidade em que vivemos, paradoxalmente, a inconstância é uma constante. O fluir do tempo traz consigo incessantes transformações na realidade histórica com as quais - como afirma Charles Mills - a humanidade tem dificuldades em lidar. Por isso, esta tende a negar a mudança em defesa de sua realidade privada perante as transformações na realidade externa à sua, rejeitando a capacidade de compreender as mudanças com uma percepção lúcida e ampla, ou seja, recusando a imaginação sociológica. Tal fenômeno, ainda que não hegemônico, atinge uma parcela considerável da humanidade, determinando o que seria uma "crise da imaginação sociológica", crise esta que tem como principal reflexo na contemporaneidade o crescimento mundial da extrema-direita.

A extrema-direita pauta sua ideologia no conservadorismo, isto é, na manutenção dos valores sociais como algo estagnado no passado e imune às influências do tempo histórico e às transformações no meio social com o transcorrer do tempo. Por conseguinte, os adeptos à tal corrente ideológica acabam por demonstrar profundo desconhecimento da realidade contemporânea e das relações que nela se dão, de tal forma tornando-se propícios a realizar o que Bacon definiria como uma "antecipação da mente", um pré-conceito. Estes, por sua vez, unem-se para formar o mais basal alicerce da teoria da extrema-direita: o senso comum. Sejam os comentários contra as vacinas, as mirabolantes teorias da conspiração ou a discriminação descarada contra grupos sociais minoritários, são inúmeras as antecipações da mente que permeiam o imaginário destes ideólogos, somados a um desprezo pela interpretação da realidade, ou seja, pela ciência.

Pois, ao contrário da ciência, a tese extremista-direitista é embasada no senso comum, portanto é superficial, subjetiva e descompromissada para com o real. Trata-se de um ideário que se comporta como um conjunto de "imperativos categóricos" que alienam o indivíduo do mundo à sua volta e não se abre aos questionamentos. Descartes eleva a dúvida ao papel de núcleo da ciência, mas não há espaço para a dúvida em uma ideologia tão próxima ao dogmático. É como um silogismo: Para haver ciência, deve existir a possibilidade de se haver dúvida. Se tal possibilidade não existe, não há ciência. 

Afinal, é somente em uma crise da imaginação sociológica, da compreensão do mundo como uma inconstante, que se viabiliza a formação de uma ideologia baseada em antecipações da mente e senso comum a qual opõe-se à ciência e opera com "verdades irrefutáveis". É somente em uma crise que é viabilizada a extrema-direita.

Murilo Lopes Cardoso da Silva
1º ano de direito (Matutino)
RA: 231222653