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quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Direito, uma ciência bipolar



Trazer as ideias de Bourdieu à discussão da legalização do aborto de fetos anencéfalos é sinônimo de tratar uma discussão que permeou todo o curso de sociologia: “a origem do direito”. Assim como foi tratado ao longo do semestre há uma miríade de abordagens sobre o intuito do direito, a que e quem ele se presta e qual o seu objetivo. E cada autor que cria uma nova leitura sobre um tema abre uma série de novos horizontes para outros pensadores desenvolverem novas teses.

Sendo a leitura de Bourdieu póstuma à grandes pensadores, como Marx e Weber, ele não poderia deixar de apreciar seus desenvolvimentos teóricos sobre as suas visões de mundo e por tabela do direito. Quando Bourdieu começa sua leitura sobre o direito, no capítulo oito de sua obra O poder simbólico, se posiciona claramente contra a tentativa Kelseniana de afastamento da a moral (usa-se aqui o artigo “a” porque Kelsen o faz em sua obra teoria pura do direito).

Segundo o autor francês esta tentativa objetiva criar uma ciência jurídica independente da leitura social e, assim, embasar o intuito de sua existência em si mesmo, analisando através deste prisma vê-se uma lógica tautológica. Bourdieu desenvolve então uma análise que nega esta visão formalista do Direito sem incorrer, contudo, no erro dos marxistas estruturalistas que, por sua vez, negam a estrutura e consideram apenas a parte material do direito.

Cria portanto um sistema de análise que, em detrimento dos sistemas supracitados, prevê a dualidade existente no modelo formal versus material. Deste binômio nasce também uma leitura mais complexa de um modelo não mais radical mas que mantém em si características distintas e contrárias. Sendo assim nasce (ou percebe-se de acordo com a entendimento positivista ou jusnaturalista do leitor) uma dicotomia dentro do direito que o autor materializa entre os leitores desta ciência jurídica, diferenciando-os entre os que o produzem (no sentido filosófico e acadêmico) e os que o aplicam, os magistrados.

Voltando enfim a interpretação do caso prático através do viés “Bourdieano” vê-se que o direito não se demonstrou como uma ferramenta do status quo ou da classe dominante, uma vez que, sob este viés se esperaria que a decisão fosse contrária a não condenação, o que segundo o princípio do direito negativo corresponderia à “legalização” do aborto de anencéfalos, contudo a mera necessidade do processo jurídico também impede o rótulo de emancipador, não agindo como uma ciência que busca criar novas fronteiras para a sociedade.

Essa situação é perfeita para a análise de Bourdieu do direito porque este, mediante a interpretação por parte dos magistrados, serviu de ferramenta para ocasionar a mudança social mas se interpretado apenas de acordo com o texto frio da lei jamais prostraria o modus operandi.

Percebo agora que toda a matéria foi pensada para que nós alunos sejamos capazes de olhar para uma realidade técnica que se desenhará nos próximos anos no curso e poder entender qual é a gênese da interpretação empregada por aqueles que ministraram as petições, atos e julgados. O intuito da matéria é, dentro das limitações de uma matéria que não é devidamente valorada dentro da instituição (e do mundo do direito como um todo), tornar-nos juristas de fato e não meros operários do direito, adiciono apenas uma observação pessoal sobre esse termo “operários do direito” que é a desvalorização da classe proletária pela academia, justo esta que tudo produz e que, no fim, é a verdadeira dona de toda a riqueza.

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