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segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Cotas raciais, emancipação social e isonomia



A instituição das cotas raciais para entrada nas universidades públicas sempre foi polêmica. A desigualdade social no Brasil é um fato que foi construído historicamente. Quando ocorreu a emancipação dos escravos com a Lei Áurea, fica claro que não houve nenhum esforço por meio do Estado no sentido de incluir socialmente os recém-libertos ou de criar oportunidades para estes. Essa ausência fez com que os libertos, que não haviam ainda sido incluídos no contrato social, ficassem em uma posição marginal, caracterizando o processo de exclusão na dinâmica pré-contratualista de Boaventura de Souza Santos. A política de cotas, portanto faria parte da luta pela inclusão desse grupo no contrato social.
As cotas são importantes no sentido de uma superação dessa disparidade social firmada historicamente.  A UNB, em 2004, implantou esse sistema, reservando 20% de suas vagas para estudantes negros e um ínfimo número para índios. No entanto, em 2009, o DEM, partido Democratas, entrou com uma ADPF, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, declarando inconstitucionais os atos que levaram à implementação do sistema de cotas da UNB. Essa tentativa, frustrada pelo STF que a julgou improcedente em 2012, declarando as cotas étnico-raciais constitucionais, remete à música Índios, de Legião Urbana que diz “... que quem tem mais do que precisa ter, quase sempre se convence que não tem o bastante e fala demais por não ter nada a dizer”.
Para Boaventura a emancipação social não é mais oposta à regulação social. Logo, o Direito, atua como instrumento de emancipação social, como nesse caso em que as cotas, associadas à essa emancipação, seriam atingidas através da regulação social, realizada pelo Direito. Há uma relação também entre a questão das cotas e o conceito de legalidade cosmopolita de Boaventura, no sentido de que o Direito seria usado, ao implementar as cotas, para romper com essa ideia, possibilitando o alcance de uma legalidade cosmopolita, que consiste não apenas no cumprimento do contrato e questões do capital, mas também contempla as manifestações da exclusão, no sentido de abranger a tutela de questões sociais.
Segundo Boaventura, vê-se que a instabilidade social é condição da estabilidade econômica. Sendo assim, a implementação do sistema de cotas representa um passo na direção de uma ruptura desse paradigma, visto que há um avanço no sentido de uma estabilidade econômica sendo preterida em relação a uma estabilidade social. Dessa forma, com o sistema de cotas também se caminha contra a estrada que leva ao fascismo social, que se caracteriza pelo pensamento unitário, no qual um único grupo detém a única verdade, a única legitimidade; pensamento este que é danoso à sociedade. Pode-se fazer, também, uma associação das cotas com uma forma de frustrar a agenda conservadora, fazendo do Direito uma real ferramenta de mudança social.
Além disso, as cotas são uma forma de se efetivar um direito que já existe, o de educação, por exemplo, que não é real para os negros. Logo, existe uma conexão da implementação das cotas com o pensamento de Weber, no sentido de que se deve contestar a forma, que coloca limitações materiais a certos grupos, para que ela seja ampliada e não garanta mais apenas os interesses da classe dominante.
O direito, tanto de educação quanto de igualdade, que para os negros restringia-se à forma, com a implementação da política das cotas, avança para a efetivação material. O Princípio da Igualdade ainda dispõe que tratamento isonômico é tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida exata de suas desigualdades, afirmando que, quando em situações distintas, as pessoas sejam tratadas de forma desigual, para que, só assim, a igualdade seja, de fato, atingida.

Vívian Gutierrez Tamaki - 1º ano de Direito - Diurno

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