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sexta-feira, 6 de novembro de 2015

A busca por um mundo cheio de preás

Um mundo cheio de preás seria a sociedade brasileira como afirmam ser: igualitária, acolhedora e sem preconceitos. Mas basta olhar de fato para a realidade para verificar que ocorre o contrário: a igualdade parece estar apenas no papel, o individualismo impera e preconceitos estão cada vez mais exaltados. Elenca-se a isso o fato de o negro ainda estar à margem socialmente, pois é evidente que ainda está preso às entranhas de um passado opressor. Com isso, como garantir a igualdade e consequentemente a justiça? Justiça, esta, que deve ser realizada para garantir uma igualdade não somente formal, mas também material.
Boaventura de Sousa Santos em Poderá o direito ser emancipatório? trata sobre a utilização do direito como um mecanismo de mudança social. A afirmação do autor sobre a questão da relatividade contemporânea destruindo o período atual condiz com a necessidade de se realizar medidas que busquem alterar o cenário social do Brasil: um passado escravocrata que não privilegiou a todos, mas que segregou a parcela negra da população, que mesmo após a abolição em 1888, continuou sobre a sombra desse passado cruel. Muitos intelectuais da época imperial brasileira, como Joaquim Nabuco, elaboraram projetos visando emancipar o escravo e integrá-lo na sociedade. No entanto, os esforços esvaíram-se diante de uma elite que somente tinha olhos para si, não se diferindo muito da atual elite brasileira, que cada vez mais vive em uma redoma de vidro, imersa em fascismos, sendo essas atitudes reafirmadas por uma visão neoliberal e capitalista, que torna a sociedade cada vez mais centrada nos interesses individuais, acentuando uma exclusão estrutural.
Com isso, para Boaventura, esse período atual seria transitório, assim como a adoção do sistema de cotas, pois é preciso adotar medidas desiguais para igualar os desiguais em suas desvantagens. Entretanto, o autor português aponta em seu texto que esse momento de transição, muitas vezes não encontra um ambiente condizente com as respostas que se buscam para as questões complexas, como por exemplo, a integração de negros nas universidades públicas do país.
Desse modo, a adoção de cotas étnico-raciais visa exatamente a realização de uma justiça não apenas para amenizar as injustiças de um passado escravista, mas para gerar um ambiente acadêmico mais plural, menos segregado, mais harmonioso, e uma sociedade mais igualitária e sem racismo. É indiscutível como a herança da escravidão é ainda presente na atualidade, visto que o acesso às melhores universidades do país é predominantemente de pessoas brancas que dispõem de condição financeira estável. Todavia, um fascismo social revestido de ideia de meritocracia para ingressar em uma universidade pública é evidente na atualidade, como por exemplo o requerimento pelo partido Democratas (DEM) para que seja revogada a adoção do sistema de reserva de vagas sob o critério étnico-racial pela UnB. Esse requerimento não condiz com um contrato social defendido por Boaventura, pois os negros no Brasil majoritariamente foram excluídos deste contrato, assim, a não implementação dessa ação afirmativa somente vai reafirmar esse caráter elitista da universidade pública brasileira, prendendo o negro à condição inferior histórica que ainda se faz presente. E isso apenas perpetua o entrave entre regulação social e a emancipação social.
Como foi apresentado na ADPF 186, o Ministro e relator Ricardo Lewandowski afirmou que o modelo constitucional brasileiro incorporou diversos mecanismos institucionais visando à correção das distorções do princípio de igualdade. Com isso, é considerada constitucional a adoção dessas ações afirmativas, sendo também verificada uma forma de emancipação social legal e a utilização do direito como instrumento de conquista social, como foi apresentada por Boaventura de Sousa Santos. Entretanto, muito se deve alterar ainda na sociedade brasileira para que se possa atingir uma sociedade igualitária de fato, sendo a adoção desse sistema um passo pequeno para se atingir um grande resultado. Assim, a negação desse sistema seria somente uma forma de cessar a emancipação legal, de cessar a ideia de um mundo de preás, que na atualidade coincidiria com a ideia dessa igualdade social, havendo uma sociedade plural tanto em idéias quanto de pessoas e isso não pode ser uma utopia.

Lara Costa Andrade
1º ano de Direito Diurno

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