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segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Indiferença Classista
“Nestes assuntos de sexualidade, ideias resistentes reinam. Não despojamos das roupas sujas. As roupas lavadas vestem o encardimento da indiferença. Travamos, com o diferente, uma luta desigual. O inimigo combatente, que se mostra à nossa frente, é em verdade aquilo que está dentro de nós”. (julgado)
       Isís era uma bela mulher. Inteligente, divertida, o sonho de perfeição de qualquer rapaz. Contudo, possuía um pequeno defeito: não nascera assim. Vivendo boa parte de sua vida com uma identidade com a qual não se identificava, inúmeras foram suas tentativas de acabar com o sofrimento. Porém, ao entender o que se passava, sua família a ajudou a receber a cirurgia de que precisava para finalmente poder ser aceita dentro do meio social. E apesar de todas as agruras em seu passado, Isís finalmente pode ser feliz, já que seu direito fundamental fora respeitado.
       Isís era uma bela mulher. Inteligente, divertida, o sonho de perfeição de qualquer rapaz. Contudo, possuía um pequeno defeito: não nascera assim. Vivendo boa parte de sua vida com uma identidade com a qual não se identificava, inúmeras foram suas tentativas de acabar com o sofrimento. Ela não possuía a quem recorrer, e o fruto de seu trabalho não era suficiente para arcar com os custos da cirurgia de que precisava. Em um rompante de desespero, decidiu roubar a quantia necessária. Isís, lutando todos os dias contra o encardimento da indiferença. Isís, o diferente que ameaça todo o estado de bem estar social. Isís. Não fora uma mulher, eles disseram, contudo facilmente a subjugaram como uma. E ninguém se importou com seus gritos, e nenhum remorso foi sentido quando seu corpo jazia sem vida dentro de uma cela escura.
        Pensador que exerceu uma grande influência dentro da área jurídica, Max Weber apresenta uma série de teorias que envolvem a sociedade atual. De fato, no julgado apresentado, uma mulher trans pleiteia o custeio da cirurgia de mudança de sexo, bem como a alteração de seu nome no registro civil. Essa transexualidade é considerada como uma patologia, pois a encaixam dentro da racionalidade teórica, isto é, dentro de conceitos teóricos do que seria esse fenômeno. Entretanto, esse conceito é carregado de valoração, pois se baseia valores, exigências éticas, políticas, características estas da racionalidade material. Assim, o diferente, já estigmatizado pela racionalidade teórica, pleiteia com um sistema jurídico coberto por lacunas o cumprimento de um direito que lhe é natural e fundamental e o respeito à dignidade da pessoa humana. Entretanto, segundo a racionalidade do direito em Weber, não deveria o direito ser um sistema sem lacunas? Como demonstram as mudanças pela qual passa o meio social, esse sistema sem lacunas é complexo demais para ser conseguido, e neste âmbito a hermenêutica jurídica, como no caso apresentado, ajuda a adequar as lacunas deixadas pelas leis às mudanças da modernidade.
     Ademais, não deveria o direito fluir do âmbito material para o formal? Não seria o próprio corpo uma propriedade privada e, portanto, caber-se-ia sua livre disposição? Com toda certeza, porém não é o que acontece na prática. Na história acima, os mesmos direitos naturais foram tratados de maneira desigual devido à diferença entre classes. A racionalidade material não é suficiente para fluir ao âmbito formal quando esta está impregnada pela ideologia classista. Mesmo o direito a propriedade privada - tão aclamado pelas classes dominantes - não é respeitado quando se trata de concedê-lo a uma minoria que amedronta por não se encaixar na padronização imposta. Livraram-se deles. Sim, é bem o modo dos senhores procederem. Livrar-se de tudo o que é desagradável, em vez de aprender a suportá-lo. (Admirável Mundo Novo)

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