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quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Weber e Direito

Em sua análise sociológica, Weber entende a modernidade como construção de diferentes dinâmicas de racionalização, sendo a Racionalização Formal, estabelecida mediante o caráter calculável das ações e seus efeitos, e a Racionalidade Material, que se trata da reivindicação que não é apenas formal, mas leva em consideração valores, exigências éticas, políticas, entre outros, de essencial importância para a compreensão do Direito dentro do estudo sociológico de Weber.
Para Weber, no campo do Direito, a dinâmica de racionalização deveria ir do material para o formal, reduzindo as decisões a princípios tecnicamente pré-determinados e o estabelecendo um sistema de regras com lógica interna, de modo que toda decisão jurídica seja a aplicação de uma disposição jurídica abstrata a uma constelação de fatos concreta; que para todo fato concreto deva ser possível encontrar, com os meios da lógica jurídica, uma decisão a partir das vigentes disposições jurídicas abstratas; e que, portanto, o direito objetivo deva constituir um sistema sem lacunas.
Apesar de a maioria dos doutrinadores e comentadores da sociologia weberiana se restringir a definir o Direito em Weber como sendo somente o que foi exposto acima, o próprio sociólogo reconhece que esse seria apenas o tipo ideal para o Direito, sendo completamente utópico uma vez que a vida social concreta e o desenvolvimento moderno enfraqueceram a possibilidade de concretização do racionalismo jurídico formal, favorecendo a formação de um Direito Natural Material, vinculado aos interesses de classe, além da particularização crescente do Direito e a influência da ética e da pressão de grupos de interesse e ideologia nas decisões jurídicas.
Essa realidade pode ser sentida no caso do Pinheirinho, analisado nas semanas anteriores, onde as convicções pessoais dos Juízes envolvidos no processo, além da pressão dos grupos interessados, exerceram papel fundamental para a retirada desastrosa e desproporcional de milhares de famílias em benefício de uma única empresa falida. Além disso, a complexidade social impede a previsão, pelo Direito, de todos os fatos passíveis de se realizarem, sendo impossível a inexistência de lacunas e sendo essa formalidade, defendida por Weber, utilizada, muitas vezes, de maneira catastrófica pelos juristas, com a aplicação de normas inadequadas ao caso real ou com a falta da necessária flexibilização das leis em casos não previstos por Códigos e Constituição.

Não foi esse o caso da decisão da Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Jales, onde, diante da demanda de um transexual pela cirurgia de mudança de sexo, bem como a alteração no registro civil, para constar novo nome e modificação do sexo masculino para o feminino, o Juiz valeu-se da interpretação das próprias normas e leis do Código Civil e da Constituição, dos Conselhos de Medicina e Psicologia e dos tratados internacionais firmados pelo Brasil para não somente conceder os pedidos ao transexual, como também para reconhecê-los como direitos fundamentais do indivíduo, afastando os preconceitos da sociedade implícitos na racionalidade material e se aproximando da racionalidade formal idealizada por Weber. A necessidade da sociedade de se padronizar as diferenças, encarando-as como patologias, explicitada pelo Juiz em sua decisão, se relaciona, de certa forma, a visão que Weber tem da modernidade, onde todas as ações e seus efeitos precisam ser calculáveis e sendo inaceitável aquilo que foge a essa regra, como é o caso da transexualidade.

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