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segunda-feira, 15 de dezembro de 2014


As demandas da constelação

 

Weber, dentre as suas análises sociológicas, dedica-se a proposição de alguns pontos no campo do direito, trazendo um pensamento sociológico deste, que, em todas as suas decisões jurídicas, deveria aplicar disposições abstratas a uma “constelação de fatos” concretos. E deveria também pensar logicamente, para toda essa “constelação de fatos”, decisões a partir da forma abstrata vigente.
Quando fossem contempladas as duas proposições, esses dois movimentos completar-se-iam, o que transformaria, portanto, o direito um sistema sem lacunas. Nele, hipoteticamente, haveria previsão e resposta para todas as infinitas estrelas da constelação. Sendo a lei instrumento desse direito, pensada de maneira geral e abstrata, seria nela encontrada as “n” previsões, materializando, dessa forma, o ápice da racionalidade do direito.
Contudo, a lei e suas compilações racionais, os códigos, já nascem, de certa forma, defasados, uma vez que demandam tempo para sua elaboração e a sociedade transmuta-se de maneira muito intensa seguindo um movimento dialético.  Ademais, um legislador nunca poderá visar todas as possibilidades no momento em que cria uma lei. Depreende-se, portanto, que o direito racional sugerido não passa de mais um tipo ideal weberiano, uma utopia. Por mais que se tente construir um direito racional sempre haverá lacunas, das quais surge a judicialização.
Exemplo desse fenômeno é o caso do pedido de cirurgia de mudança de sexo, mudança de nome e gênero no registro deferido pelo juiz da comarca de Jales, Dr. Fernando Antônio de Lima. Sem “disposições abstratas” especificas para o caso que surgiu como uma supernova na constelação de fatos concretos, o pedido foi autorizada com base no Art. 13 do CC: “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”.
Com um olhar mais conservador o caso nunca poderia ter sido justificado nesse artigo ou ainda não teria resultado favorável ao requerente, pois haveria diminuição permanente da integridade física e contradição dos “bons costumes”. Estes últimos escritos entre aspas, visto como uma imposição da sociedade que tem pouco tato para lidar com o diferente, com aquilo que foge ao padrão.
Todavia, os olhos de quem julgava o caso não seguiam o senso comum. Ao julgar o pedido favorável, abriu-se precedente para outros casos serem decididos de forma semelhante por analogia.
Dessa forma, uma racionalidade material, que levou em conta valores e exigências éticas, não aquelas ditadas pelos ”bons costumes”, mas valores enraizados no principio da dignidade da pessoa humana. A partir daí poderá ser construída uma racionalidade formal, atendendo à proposta de Weber: uma vez que surgiu um novo fato na constelação ao qual foi aplicado a disposição abstrata, posteriormente disposições poderão ser pensadas logicamente sobre esse fato, cobrindo uma lacuna.  Assim, o direito continuará sua renovação infinita em busca de excluir lacunas, porém, sem nunca alcançar seu tipo ideal.

Letícia Raquel de Lava Granjeia – 1º Ano – Direito Noturno

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